Capítulo XI - Varanasi
Dia 25 de Agosto de 2012 || 13h55 – Varanasi
Hoje (ainda há pouco) aconteceu uma coisa com o espanhol que eu não estava à espera. Mas vou começar por falar do final do dia de ontem.
Depois de termos ido jantar os dois ao mesmo bar do dia anterior, viemos para o lobby do hotel. Começámos a falar e ele percebeu que eu tinha um problema dentro de mim para resolver, que estava relacionado com o meu pai. Perguntou-me se eu queria fazer terapia com ele (uma que eu nunca tinha ouvido falar, e nem consegui perceber o nome), e eu lá acabei por aceitar. Foi rápido e estranho, mas acho que foi positivo. E foi estranho também isto ter acontecido aqui na Índia, com um espanhol que eu conheci há dois dias.
Hoje a coisa já foi diferente e também muito estranha. Tomámos o pequeno-almoço juntos e viemos outra vez para o lobby (onde me encontro, porque já tive que fazer o check-out). Como já tínhamos combinado antes que ele me ajudaria com a ida para a estação de comboios (e eu até lhe tinha pedido para ele ir comigo também), ele então foi ligar para o taxista que lhe tinha trazido até ao hotel. O hotel estava-me a pedir 800 rupias e ele pediu 400 ao seu condutor. Só que afinal este taxista é condutor de um tuc-tuc. E eu estava-lhe a dizer que achava muito porque eu tinha pago 500 por um carro da estação até ao hotel, e só não tinha pago 400 porque não regateei mais. Ora, nunca se paga o mesmo numa viagem que se faz de carro ou de tuc-tuc. E ele sabe isso muito bem. Eu até lhe perguntei se os 400 eram para a ida e para o regresso. E ele dizia que eram só para a ida, e que não interessava o transporte mas sim o caminho que se tem que percorrer.
Bom, como ele viu que eu não estava convencida, foi logo a correr desmarcar com o seu taxista. Ou seja, ele ficou chateado por eu estar a “pôr em causa” a ajuda dele, e por isso nem perguntou mais nada e de imediato desmarcou o transporte.
Eu depois liguei para o taxista que me tinha trazido e ele pediu-me 500 rupias outra vez. Primeiro eu disse-lhe que não e ele não se importou que eu recusasse e também não baixou o preço, mas depois tive que lhe ligar outra vez porque não consegui arranjar outra hipótese.
Entretanto (antes de ligar a segunda vez) o espanhol perguntou-me o que é que eu ia fazer em relação ao transporte e eu disse-lhe que não sabia. Ele então disse que ia a um templo que queria ir, perguntou-me se eu ficava (disse-lhe que sim) e foi-se embora despedindo-se de mim.
16h50 – Varanasi
Estou no lobby do hotel a fazer tempo desde o meio-dia. O taxista disse que vinha às 18h. É um bocado apertado, mas espero que corra tudo bem. Já fui à internet à rua, já fui almoçar e já falei com o Hacier outra vez (não conseguiu ir ao templo porque estava muito trânsito).
Espero conseguir chegar a tempo à estação de comboios, tal como também espero encontrar mais turistas como aconteceu na vinda para cá. Japoneses devo encontrar (o hotel está cheio deles), mas parece que eles não se misturam com mais ninguém, para além de que, curiosamente, muitos deles também não falam inglês.
Sei que falta pouco para chegar a casa, mas ao mesmo tempo parece que nunca mais acontece. Ainda continuo ansiosamente à espera da hora em que vou estar à espera para entrar no avião, depois de já ter feito o check-in…
20h15 – Varanasi
Já estou no comboio e acabei de ter a maior aventura da minha vida!
Mas primeiro o hotel.
Eu tinha pedido ao taxista para me vir buscar às 17h30. Da primeira vez ele disse que sim, mas no segundo telefonema disse que já não podia e marcou para as 18h. Eu tinha comboio às 19h47 e a estação ainda fica a 1h de caminho mais ou menos. Ainda me passou pela cabeça ir para a rua lá para as 17h e andar a perguntar aos rickshaws quanto me levavam, mas acabei por não o fazer (na verdade eu até nem tinha gostado muito do taxista, mas na altura não estava a ver outra opção). No entanto, eram para aí umas 17h30 e eu já estava a ficar nervosa, até porque estava a chover imenso pela segunda vez (o que significava que o trânsito iria estar ainda mais caótico). Para além disso, tinha comigo a ligeira sensação de que o taxista não iria aparecer ou então que chegaria bastante atrasado, não sei porquê.
Entretanto, eram umas 17h45 e chega um tuc-tuc ao hotel para deixar uns japoneses. Nem pensei duas vezes! Levantei-me e fui perguntar ao homem quanto me levava até à estação. Disse-me 300 (o mesmo que já me tinham pedido antes quando cheguei a Varanasi) e eu nem regateei! Só me queria vir embora o mais depressa possível, por um valor mais baixo, e se possível sem o outro homem! Fui! E nem quis saber do outro! Estes “índios” – como lhe chamam os espanhóis – também não são honestos connosco mesmo!
O homem deve ter percebido que eu estava com pressa porque foi a abrir! E como era um tuc-tuc conseguia passar melhor por entre o trânsito do que acontece com os carros. Ele até foi por outra estrada para se desviar do caos.
A certa altura ele parou numa bomba de gasolina para encher uma garrafa e, claro, aproveitou-se logo: “350 rupies for fast, madam?” “Ok!”, disse-lhe eu. Ficou todo contente e lá foi a abrir. Devia ter negociado o preço inicialmente, bolas!
Mais à frente o senhor parou outra vez. Primeiro acendeu uma luz no seu tuc-tuc, e assim que parou veio um homem pôr-lhe no guiador um fio de flores pequeninas (desses das oferendas). O homem lá pareceu benzer-se e seguiu. Sempre a abrir. Parecia um jogo de corridas, mas daqueles muito mau. O homem inclinava-se para um lado e para o outro e tudo!
Depois, passado um tempo, acendeu a luz outra vez, começou a abrandar a mota e atirou uma moeda (acho que para uma dessas pessoas dos fios de flores).
Até que chegámos! 1h15m depois. São e salvos! Perguntei-lhe se ele me poderia ajudar a ir comigo à plataforma correta, mas ele não percebia nada do que eu dizia. Veio um outro homem (aliás, vieram uma data deles) que falava inglês e que acabou por me levar até à plataforma 3.
Ainda procurei por estrangeiros, mas nada… Sentei-me num banco onde estava um indiano jovem que tinha bom aspeto. Perguntei-lhe se aquela era a plataforma correta e ele disse-me que sim, e que também ia no mesmo comboio que eu. Começámos a falar. Via-se que era de uma classe mais alta. Talvez média. E que tinha estudos. Falava inglês (com o típico sotaque dificílimo indiano) e era de Agra, onde trabalhava. Perguntei-lhe se me podia trocar uma nota de 500, para eu poder comprar uma garrafa de água. Trocou (tinha um maço de notas no bolso).
De repente ele começa a olhar para a plataforma 4, que estava do outro lado. Era o nosso comboio!!! Bem, eu nem sei o que aconteceria se eu nunca tivesse falado com este rapaz. Eu acho que neste momento estaria a chorar na estação por ter perdido o comboio!
Ele também está na carruagem A2. E começámos a correr! Bom, ele começou a correr e eu fui atrás dele. Só que… para o sentido inverso onde deveríamos ir! E isto à chuva! Da pesada!
Chegámos ao fim do comboio e afinal a nossa carruagem era a da frente! Começámos a correr para trás, até que ele entra numa carruagem de “sleepers”. Fiquei chocada com o que vi. Consegue-se perceber perfeitamente que esta é a zona da classe mais pobre. Está apinhada de gente! Não dá sequer para dormir a não ser sentado. Começámos a percorrer as carruagens, mas ainda estávamos muito longe. Ele saiu outra vez (ou fui eu, já não me lembro) e continuámos a correr no sentido correto. E mais uma vez à chuva! E as “sleepers” não acabavam! O comboio parecia que nunca mais tinha fim! Que pânico! Teríamos que subir outra vez ou o comboio partia sem nós!
Lá conseguimos entrar no princípio da carruagem correta e começámos a andar outra vez pelos corredores. Ele ficou-se logo por ali, e eu continuei sozinha. Entretanto dei com um revisor que me levou até à minha “cama” correta.
Estou com uma família (pai, mãe e filho). A mulher não tirava os olhos de mim. Não é simpática. Estrangeiros nem vê-los…
Já me fui mudar à casa-de-banho. Estava completamente ensopada. Dos pés à cabeça. Só não mudei as cuecas! Enfim… não é fácil…
(PS: Esqueci-me de dizer que o rapaz entretanto veio ver como eu estava. Tão querido! Também já tinha mudado de roupa. Outra coisa, esta gente arrota que nem uns porcos, bolas!)
Dia 26-08-2012 || 10h40 – Deli (aeroporto)
Estou tão contente! Finalmente estou no aeroporto! Ainda faltam mais de 12h para eu me ir embora, mas eu nem quero saber. Só esperava por este dia!
Ainda faltava uma hora para chegar e a família indiana já estava a tirar as malas debaixo dos assentos e pô-las a jeito. Pô-las a jeito significa que as encostaram à minha cama para eles terem espaço do lado deles para porem as pernas, ao contrário de mim! O pessoal aqui não tem mesmo noção de espaço, principalmente do espaço dos outros! E depois atiravam tudo para o chão, em vez de porem em cima da mesa, pois sabem que irá passar alguém para recolher. Ir à casa-de-banho também foi uma aventura! Desta vez, não sei porquê, não havia “western toilet”, só o buraco no chão. Estar de cócoras a fazer as minhas necessidades, com um comboio em movimento que me abana o corpo todo de um lado para o outro (e outras coisas mais), a tentar não molhar-me, enquanto me agarro a algo para não cair… Enfim, um filme…
Quando cheguei, reparei que havia duas saídas. Saí para a zona Pahar Ganj (onde eu tinha ficado quando cheguei a primeira vez à Índia). Não vi lá ninguém à minha espera como estava combinado com o Raja… A ida para o aeroporto também estava incluída no pacote que comprei, mas tudo bem… Eu também já não queria ir à agência. Queria mesmo era vir para o aeroporto.
Enfim… goodbye India!