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Raquel Dominguez Raquel Dominguez

Porque fazemos coisas que não gostamos assim tanto de fazer?

Porque ainda não percebemos que há uma ligeira diferença entre gostarmos realmente de fazer uma coisa e gostarmos da ideia de fazer essa coisa.

Mark Manson, o famoso autor do livro “A Arte Subtil de Dizer que se F*da”, neste vídeo explica porquê.

A verdade é que há uma diferença entre gostarmos realmente de fazer uma coisa e gostarmos da ideia de fazer essa coisa. E o problema é que, muitas vezes, e sem nos darmos conta, escolhemos fazer uma coisa porque achamos que isso vai resolver algo na nossa vida, isto é, preencher uma necessidade nossa.

Como?

Mark dá-nos um exemplo.

Houve uma altura da sua vida, antes de ser escritor, que ele queria ser surfista. Até que percebeu que o que ele queria mesmo era ser um tipo cool e atlético - quase como um “sexy vagabundo da praia”  (segundo as suas próprias palavras) - e pensou que ao tornar-se surfista conseguiria preencher esse vazio.

Só que o que ele acabou por descobrir, com o tempo, é que ser surfista não é o mesmo do que realmente gostar de fazer surf.

Agora que é escritor ele conta que há pessoas que vêm ter com ele dizer-lhe que também querem ser escritoras e escrever um livro, e perguntam-lhe como podem começar a fazê-lo. 

A resposta dele?

É simples.

Se tu queres escrever algo, tu simplesmente começas a escrever. A única questão aqui é: O que é que te está a impedir de o fazer?

Mark acredita que, na maioria dos casos, estas pessoas até nem gostam assim tanto de escrever, mas gostam da ideia de serem escritoras, pois acham que isso lhes vai fazer parecer mais inteligentes ou admiradas. Ou seja, o que nós muitas vezes queremos é a identidade de algo, mais do que a coisa em si. Algo que eu também já falei aqui.

Fazemos coisas que não gostamos assim tanto de fazer pela identidade que isso nos dá. Por isso é que depois sentimos tanta dificuldade em largar o trabalho que nos dá essa identidade, uma vez que já nos identificámos com tudo aquilo que ganhámos com ele. Para além disso, o mais provável é que depois acabemos por ir parar àquele lugar onde não sabemos, afinal, quem somos.

E isso é assustador.

Muitas vezes a coragem de deixar de fazer algo que afinal não gostamos assim tanto, tem mais a ver com o voltar a esse lugar de “não sabermos quem realmente somos e o que queremos fazer”, do que propriamente com o medo de perder dinheiro ou de não ter a aprovação da família.

Assim, uma pergunta que podes fazer a ti mesma se quiseres perceber em que situação estás, é a seguinte:

O que é que na tua vida estás a fazer, não porque gostas de o fazer, mas porque gostas do tipo de pessoa que te torna ou que aparentas aos outros?

Normalmente são estas coisas que nos causam ansiedade ou um sentimento de insatisfação que não conseguimos explicar. Isto já para não falar da estranha sensação de não nos sentirmos verdadeiramente realizados, apesar de todo o sucesso que até possamos ter. Mas é normal sentirmos isso, tendo em conta que nesta área da nossa vida não estamos completamente alinhados com o que realmente somos. Estamos lá pelos benefícios e não pela coisa em si mesma.

E a vida é sobre fazer algo pela coisa em si mesma.

“Como podemos manter a nossa identidade no meio de tanto estímulo externo?”

Fizeram-me esta pergunta num dos encontros que realizei com pessoas deste grupo de whatsapp e penso que faz todo o sentido respondê-la no seguimento do que foi dito até agora. E pegando nalgumas dessas ideias, penso que o problema não está assim tanto na quantidade de estímulos que nos chegam de fora, mas mais na nossa tentativa de querermos preencher os nossos vazios internos com eles.

Vou dar-te um exemplo pessoal.

Durante muito tempo da minha vida eu só queria ter sucesso na vida, sobretudo a nível profissional  (apenas não contava com o tempo que demorei a tentar perceber em que área é que isso seria… Podes ler sobre isso tudo aqui). E quando me tornei Consultora de Feng Shui, mais urgência nisso passei a ter. Ainda por cima eu tinha largado tudo para trabalhar apenas com o Feng Shui e, por isso, na minha cabeça, eu tinha que provar que era capaz.

Mas, na verdade, não era aos outros. Era a mim.

Quando comecei a “sabotar” o pouco sucesso que até já tinha conseguido alcançar - porque entretanto já não estava assim tão interessada em fazer Feng Shui como no início -, a minha frustração chegou mesmo aos píncaros. Eu não percebia porque raio é que eu não conseguia ter sucesso na vida! Só que a verdadeira pergunta a fazer era: Mas porque é que eu queria tanto ter sucesso na vida?

Eu digo-te porquê.

Porque, lá no fundo, eu sempre me senti uma falhada. Sim, era essa a verdadeira razão. Era esse o vazio que eu queria preencher ao me tornar uma profissional de sucesso no que quer que fosse que eu escolhesse fazer.

Por isso é que eu me fartava de fazer cursos online e ler livros de desenvolvimento pessoal, nomeadamente aqueles que me ensinavam a ter sucesso na vida. E, aparentemente, até nem havia mal nenhum nisso. Antes pelo contrário. Muito do que eu consumia eram conteúdos que faziam todo o sentido para pessoas que têm negócios próprios, como um curso de Marketing Digital ou um livro que nos ensina a libertarmo-nos de crenças limitadoras. E isto já para não falar de todas as páginas que eu seguia no Instagram de pessoas que tinham atingido uma vida de sucesso e que agora ensinavam outros a consegui-lo também.

Para mim elas eram uma inspiração.

E, até certo ponto, continuam a ser. Tal como todos os cursos que continuo a fazer e os livros que continuo a ler.

Então qual é a diferença?

É subtil, mas está lá. Só que a resposta à questão não tem tanto a ver com o que faço, mas sim com a razão pela qual o faço.

Como te disse antes, eu fazia-o para, inconscientemente, colmatar inseguranças minhas. O problema é que, por mais cursos que fizesse ou livros que lesse, essas inseguranças nunca se iam embora. Ou seja:

Coisas externas 0. Inseguranças 1.

Foi por isso que te disse, no início deste trecho, que talvez o problema não esteja tanto nos estímulos que nos chegam de fora, mas sim na razão pela qual não conseguimos deixar que eles absorvam tanto a nossa atenção ou nos influenciem tanto quanto gostaríamos. Isto porque tenho-me apercebido de que quanto mais conheço os meus “vazios” e trabalho neles em terapia, menos permeável me vou sentindo às influencias externas.

Se é sempre assim?

Não. E penso que nunca vai ser. E acho que é aí que também está um dos nossos maiores erros. O de acharmos que um dia iremos estar completamente resolvidos.

Somos humanos. Não máquinas.

E acho que o desenvolvimento pessoal têm-nos feito esquecer um pouco isso (a minha psicóloga que o diga).

Por isso, independentemente do que te disse até agora como resposta à questão “Como podemos manter a nossa identidade no meio de tanto estimulo externo?”, o que quero realmente responder-te é isto:

Não te preocupes com isso. Há coisas na tua identidade que vão mudando ao longo da vida e ainda bem que assim o é. E são precisamente os estímulos externos que têm um papel preponderante nisso, pois é através deles que nós nos conhecemos, que nós nos perdemos e que nos voltamos a encontrar.

Assim, não te agarres àquilo que achas que é a tua identidade. Até porque quanto mais fazemos isso, mais a vida nos puxa o tapete e faz-nos recomeçar tudo outra vez.


Nota: a primeira parte do texto foi retirada, inspirada e traduzida deste vídeo de Mark Manson.

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A minha história

Quando andas à procura do teu lugar no mundo.

Nunca fui aquele tipo de criança que dizia: “Quando for grande quero ser…”.

Isto porque nunca soube o que queria ser.

Ainda hoje não sei bem. Só sei o que gosto e o que não gosto de fazer. Sei que tipos de trabalhos se encaixam melhor no meu perfil e aqueles que me anulam completamente. Sei em que ambientes consigo dar o meu melhor e aqueles que acabam comigo. E sei, sobretudo, como é importante para mim trabalhar em algo que dê sentido à minha vida. Como se o trabalho fosse uma extensão minha, de quem eu sou e do que tenho para dar ao mundo, e não apenas um modo de subsistência.

Até porque eu gosto de trabalhar.

Eu gosto de me sentir útil. Gosto de saber que aquilo que faço ou a forma como o faço faz diferença na vida de alguém. Gosto do que sinto quando estou a dar o que de melhor tenho para dar ao mundo e alguém do outro lado está a recebê-lo.

É uma sensação de plenitude. De realização. De sentir que estou no sítio certo à hora certa e a fazer o que é o certo para mim.

E qual a profissão?

Aí é que está. Não sei...

Nunca consegui traduzir todos estes sentimentos numa única profissão. E, sinceramente, começo a achar que não é para fazê-lo.

Talvez tenha sido esse o meu erro durante estes últimos 20 anos da minha vida: procurar o que não há para ser encontrado. Talvez o que haja seja simplesmente algo para eu fazer. Só que enquanto eu andar à procura de uma profissão, trabalho ou atividade que já existe, nunca o irei encontrar.

Quem sabe se não é para criar o meu próprio trabalho? E, se assim for, é normal eu ter andado perdida durante tanto tempo. Aliás, era até suposto, pois só assim é que eu conseguia ir recolhendo as peças que vão fazer parte do meu puzzle final.

Ou talvez, quem sabe, não haja sequer um final. Talvez não seja para eu chegar a lado nenhum. Há pessoas que têm uma vida profissional tão certinha e direitinha que depois achamos que é suposto ser assim para toda a gente.

Mas não é.

E cada vez mais começo a estar em paz com isso.

O que dizer então?

Por volta do ano de 2017 decidi criar um novo site, pois sentia que aquele que tinha na altura não me dava muita liberdade para escrever sobre outras coisas para além de Feng Shui, bem como criar outro tipo de consultas. Só que quando chegou a altura de escrever a página “Sobre mim” de repente senti-me assim:

Então e agora o que é que eu escrevo aqui? O que é que eu “sou”? Que nome é que eu dou àquilo que eu faço? O que é que eu já fiz que seja relevante colocar aqui?

Lá tinham voltado de novo os meus velhos fantasmas…

Depois de dar muitas voltas à cabeça, acabei por escrever precisamente sobre isso mesmo. Sobre a minha dificuldade em escrever sobre mim e sobre tudo aquilo que eu já tinha feito até àquela altura.

E assim ficou:

***

SOBRE MIM

Confesso-te que é um pouco difícil para mim dizer-te quem sou.

É que eu não “sou” apenas uma profissão. Muito menos uma dessas profissões que costumamos dizer em criança quando nos perguntam: O que queres ser quando fores grande?

Mas já fui.

Na verdade, já fui muitas profissões. Mas nenhumas delas se encaixou bem naquilo que eu sou. Isto porque eu sou muita coisa. E quando se é muita coisa, também se acaba por fazer muita coisa ao longo da vida.

Foi precisamente o que eu fiz.

O QUE JÁ FIZ:

Fiz duas licenciaturas e um curso de três anos de Feng Shui.

A primeira licenciatura não a fiz por gosto. Fiz porque os meus pais sempre me disseram que eu tinha que estudar para me sair bem na vida. O problema é que eu não sabia o que queria fazer para o resto da minha vida. Porque também ainda não sabia bem quem eu era. E então lá preenchi os papéis de candidatura ao ensino superior, escrevendo seis cursos diferentes nas seis opções que tinha.

Entrei na terceira. Era a de Linguística.

Após ter terminado o curso inscrevi-me no programa Erasmus. Não porque queria continuar a estudar, mas porque queria viajar!

Entrei. Fui para Inglaterra e voltei.

Tinha agora uma licenciatura num bolso e uma pós-graduação no outro. Para além de ambas não me servirem para nada, eu continuava sem saber o que queria fazer. Exceto numa única coisa:

Viajar! Era o que eu mais queria fazer na vida! E isso eu sabia-o bem.

Achei, então, que me iria encaixar bem numa profissão que me permitisse viajar. E foi assim que fui trabalhar para um cruzeiro e, logo de seguida, para uma companhia aérea como assistente de bordo.

Com isso saciei, até certo ponto, a minha sede por viagens. Mas não saciei o meu sentimento de realização profissional. Afinal ainda não era neste tipo de profissões que eu me encaixava…

Foi quando decidi trabalhar com crianças.

Acabei por conseguir um trabalho como professora de inglês nas AEC’s (Atividades de Enriquecimento Curricular) do 1º ciclo. Foi assim que descobri o meu gosto pelo ensino. Foi assim que descobri que tenho jeito para ensinar. Quis ser professora, mas nem para isso a licenciatura em Linguística me servia.

Continuei nas AEC’s por mais um tempo, mas cedo percebi que esse trabalho não é economicamente viável para ninguém. Tentei dar explicações particulares de inglês e ser professora de português para estrangeiros. Nada funcionou. Afinal também não era por aqui…

Foi quando decidi tirar outra licenciatura. Desta vez por escolha própria.

Enquanto trabalhava de dia como administrativa, estudava à noite no curso de Artes Decorativas. Três anos depois tinha mais um canudo na mão, juntamente com um receio inesperado de não querer, aos 29 anos, começar tudo de novo num atelier qualquer a ganhar o ordenado mínimo a recibos verdes.

Há uma frase do Jim Rohn que diz: Quando queres muito uma coisa encontras uma forma. Quando não queres encontras uma desculpa. E pelos vistos eu já tinha a minha desculpa quando percebi que até gostava bastante de decoração, mas não o suficiente para fazer o que fosse preciso para “ser” essa profissão.

E foi aí que decidi entrar para o curso de Feng Shui. Achei que com este acrescento eu conseguiria mais facilmente arranjar alguns trabalhos de decoração.

Mais uma vez estava enganada…

Sem querer o curso de Feng Shui despertou em mim uma vontade enorme de trabalhar na área do desenvolvimento pessoal. Algo que eu também já fazia comigo. Algo que eu adoro explorar.

Finalmente tinha encontrado uma profissão! Iria ser consultora e professora de Feng Shui!

Achava eu…

O MEU DILEMA:

De facto, até muito recentemente fui Consultora de Feng Shui. Adorei cada fase pela qual passei, mas confesso que já me estava a sentir um pouco presa na profissão. Com o tempo fui-me apercebendo de que eu era, queria e podia fazer muito mais do que aquilo que a profissão me permitia. Mas o rótulo de Consultora de Feng Shui não me deixava…

E foi assim que decidi acabar com ele tornando-me, simplesmente, naquilo que eu sempre fui, sou e serei: a Raquel, uma pessoa que gosta de aprender, ensinar, escrever, palestrar, inspirar, motivar, viajar, estar com pessoas, estar sozinha e tantas outras coisas mais que vou descobrindo ao longo da minha vida.

 

A MINHA DESCOBERTA:

Imagino que por esta altura já estejas a pensar: Bom, mas esta miúda é uma confusão!

Pode ser, se assim o quiseres chamar. Mas eu diria que, mais do que confusa, eu sempre me senti foi perdida!

Perdida sobre quem eu era, sobre o que gostava de fazer, o que queria fazer e no que é que eu era boa a fazer. E perdida, também, sobre o lugar onde eu me encaixava. Porque eu nunca me senti realmente confortável em lado nenhum.

Olhando para trás, penso que toda esta “confusão” na minha vida é apenas o resultado de alguém que nunca deixou de ir atrás da ÚNICA coisa em que sempre acreditou:

Um dia vou fazer aquilo que gosto!

Eu só tinha que descobrir o que isso era.  

E foi aí, num dos meus muitos momentos de auto-análise, após ter passado por muita frustração, que eu descobri que para mim não há, nem nunca vai haver, apenas um isso. Pois isso significa que eu me estou a restringir, mais uma vez, a uma única profissão. E eu não sou apenas uma profissão.

Eu sou tudo aquilo que eu quiser ser.

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Capítulo XI - Varanasi

Hoje (ainda há pouco) aconteceu uma coisa com o espanhol que eu não estava à espera. Mas vou começar por falar do final do dia de ontem.

Dia 25 de Agosto de 2012 || 13h55 – Varanasi

Hoje (ainda há pouco) aconteceu uma coisa com o espanhol que eu não estava à espera. Mas vou começar por falar do final do dia de ontem.

Depois de termos ido jantar os dois ao mesmo bar do dia anterior, viemos para o lobby do hotel. Começámos a falar e ele percebeu que eu tinha um problema dentro de mim para resolver, que estava relacionado com o meu pai. Perguntou-me se eu queria fazer terapia com ele (uma que eu nunca tinha ouvido falar, e nem consegui perceber o nome), e eu lá acabei por aceitar. Foi rápido e estranho, mas acho que foi positivo. E foi estranho também isto ter acontecido aqui na Índia, com um espanhol que eu conheci há dois dias.

Hoje a coisa já foi diferente e também muito estranha. Tomámos o pequeno-almoço juntos e viemos outra vez para o lobby (onde me encontro, porque já tive que fazer o check-out). Como já tínhamos combinado antes que ele me ajudaria com a ida para a estação de comboios (e eu até lhe tinha pedido para ele ir comigo também), ele então foi ligar para o taxista que lhe tinha trazido até ao hotel. O hotel estava-me a pedir 800 rupias e ele pediu 400 ao seu condutor. Só que afinal este taxista é condutor de um tuc-tuc. E eu estava-lhe a dizer que achava muito porque eu tinha pago 500 por um carro da estação até ao hotel, e só não tinha pago 400 porque não regateei mais. Ora, nunca se paga o mesmo numa viagem que se faz de carro ou de tuc-tuc. E ele sabe isso muito bem. Eu até lhe perguntei se os 400 eram para a ida e para o regresso. E ele dizia que eram só para a ida, e que não interessava o transporte mas sim o caminho que se tem que percorrer.

Bom, como ele viu que eu não estava convencida, foi logo a correr desmarcar com o seu taxista. Ou seja, ele ficou chateado por eu estar a “pôr em causa” a ajuda dele, e por isso nem perguntou mais nada e de imediato desmarcou o transporte.

Eu depois liguei para o taxista que me tinha trazido e ele pediu-me 500 rupias outra vez. Primeiro eu disse-lhe que não e ele não se importou que eu recusasse e também não baixou o preço, mas depois tive que lhe ligar outra vez porque não consegui arranjar outra hipótese.

Entretanto (antes de ligar a segunda vez) o espanhol perguntou-me o que é que eu ia fazer em relação ao transporte e eu disse-lhe que não sabia. Ele então disse que ia a um templo que queria ir, perguntou-me se eu ficava (disse-lhe que sim) e foi-se embora despedindo-se de mim.

16h50 – Varanasi

Estou no lobby do hotel a fazer tempo desde o meio-dia. O taxista disse que vinha às 18h. É um bocado apertado, mas espero que corra tudo bem. Já fui à internet à rua, já fui almoçar e já falei com o Hacier outra vez (não conseguiu ir ao templo porque estava muito trânsito).

Espero conseguir chegar a tempo à estação de comboios, tal como também espero encontrar mais turistas como aconteceu na vinda para cá. Japoneses devo encontrar (o hotel está cheio deles), mas parece que eles não se misturam com mais ninguém, para além de que, curiosamente, muitos deles também não falam inglês.

Sei que falta pouco para chegar a casa, mas ao mesmo tempo parece que nunca mais acontece. Ainda continuo ansiosamente à espera da hora em que vou estar à espera para entrar no avião, depois de já ter feito o check-in

20h15 – Varanasi

Já estou no comboio e acabei de ter a maior aventura da minha vida!

Mas primeiro o hotel.

Eu tinha pedido ao taxista para me vir buscar às 17h30. Da primeira vez ele disse que sim, mas no segundo telefonema disse que já não podia e marcou para as 18h. Eu tinha comboio às 19h47 e a estação ainda fica a 1h de caminho mais ou menos. Ainda me passou pela cabeça ir para a rua lá para as 17h e andar a perguntar aos rickshaws quanto me levavam, mas acabei por não o fazer (na verdade eu até nem tinha gostado muito do taxista, mas na altura não estava a ver outra opção). No entanto, eram para aí umas 17h30 e eu já estava a ficar nervosa, até porque estava a chover imenso pela segunda vez (o que significava que o trânsito iria estar ainda mais caótico). Para além disso, tinha comigo a ligeira sensação de que o taxista não iria aparecer ou então que chegaria bastante atrasado, não sei porquê.

Entretanto, eram umas 17h45 e chega um tuc-tuc ao hotel para deixar uns japoneses. Nem pensei duas vezes! Levantei-me e fui perguntar ao homem quanto me levava até à estação. Disse-me 300 (o mesmo que já me tinham pedido antes quando cheguei a Varanasi) e eu nem regateei! Só me queria vir embora o mais depressa possível, por um valor mais baixo, e se possível sem o outro homem! Fui! E nem quis saber do outro! Estes “índios” – como lhe chamam os espanhóis – também não são honestos connosco mesmo!

O homem deve ter percebido que eu estava com pressa porque foi a abrir! E como era um tuc-tuc conseguia passar melhor por entre o trânsito do que acontece com os carros. Ele até foi por outra estrada para se desviar do caos.

A certa altura ele parou numa bomba de gasolina para encher uma garrafa e, claro, aproveitou-se logo: “350 rupies for fast, madam?” “Ok!”, disse-lhe eu. Ficou todo contente e lá foi a abrir. Devia ter negociado o preço inicialmente, bolas!

Mais à frente o senhor parou outra vez. Primeiro acendeu uma luz no seu tuc-tuc, e assim que parou veio um homem pôr-lhe no guiador um fio de flores pequeninas (desses das oferendas). O homem lá pareceu benzer-se e seguiu. Sempre a abrir. Parecia um jogo de corridas, mas daqueles muito mau. O homem inclinava-se para um lado e para o outro e tudo!

Depois, passado um tempo, acendeu a luz outra vez, começou a abrandar a mota e atirou uma moeda (acho que para uma dessas pessoas dos fios de flores).

Até que chegámos! 1h15m depois. São e salvos! Perguntei-lhe se ele me poderia ajudar a ir comigo à plataforma correta, mas ele não percebia nada do que eu dizia. Veio um outro homem (aliás, vieram uma data deles) que falava inglês e que acabou por me levar até à plataforma 3.

Ainda procurei por estrangeiros, mas nada… Sentei-me num banco onde estava um indiano jovem que tinha bom aspeto. Perguntei-lhe se aquela era a plataforma correta e ele disse-me que sim, e que também ia no mesmo comboio que eu. Começámos a falar. Via-se que era de uma classe mais alta. Talvez média. E que tinha estudos. Falava inglês (com o típico sotaque dificílimo indiano) e era de Agra, onde trabalhava. Perguntei-lhe se me podia trocar uma nota de 500, para eu poder comprar uma garrafa de água. Trocou (tinha um maço de notas no bolso).

De repente ele começa a olhar para a plataforma 4, que estava do outro lado. Era o nosso comboio!!! Bem, eu nem sei o que aconteceria se eu nunca tivesse falado com este rapaz. Eu acho que neste momento estaria a chorar na estação por ter perdido o comboio!

Ele também está na carruagem A2. E começámos a correr! Bom, ele começou a correr e eu fui atrás dele. Só que… para o sentido inverso onde deveríamos ir! E isto à chuva! Da pesada!

Chegámos ao fim do comboio e afinal a nossa carruagem era a da frente! Começámos a correr para trás, até que ele entra numa carruagem de “sleepers”. Fiquei chocada com o que vi. Consegue-se perceber perfeitamente que esta é a zona da classe mais pobre. Está apinhada de gente! Não dá sequer para dormir a não ser sentado. Começámos a percorrer as carruagens, mas ainda estávamos muito longe. Ele saiu outra vez (ou fui eu, já não me lembro) e continuámos a correr no sentido correto. E mais uma vez à chuva! E as “sleepers” não acabavam! O comboio parecia que nunca mais tinha fim! Que pânico! Teríamos que subir outra vez ou o comboio partia sem nós!

Lá conseguimos entrar no princípio da carruagem correta e começámos a andar outra vez pelos corredores. Ele ficou-se logo por ali, e eu continuei sozinha. Entretanto dei com um revisor que me levou até à minha “cama” correta.

Estou com uma família (pai, mãe e filho). A mulher não tirava os olhos de mim. Não é simpática. Estrangeiros nem vê-los…

Já me fui mudar à casa-de-banho. Estava completamente ensopada. Dos pés à cabeça. Só não mudei as cuecas! Enfim… não é fácil…

(PS: Esqueci-me de dizer que o rapaz entretanto veio ver como eu estava. Tão querido! Também já tinha mudado de roupa. Outra coisa, esta gente arrota que nem uns porcos, bolas!)

Dia 26-08-2012 || 10h40 – Deli (aeroporto)

Estou tão contente! Finalmente estou no aeroporto! Ainda faltam mais de 12h para eu me ir embora, mas eu nem quero saber. Só esperava por este dia!

Ainda faltava uma hora para chegar e a família indiana já estava a tirar as malas debaixo dos assentos e pô-las a jeito. Pô-las a jeito significa que as encostaram à minha cama para eles terem espaço do lado deles para porem as pernas, ao contrário de mim! O pessoal aqui não tem mesmo noção de espaço, principalmente do espaço dos outros! E depois atiravam tudo para o chão, em vez de porem em cima da mesa, pois sabem que irá passar alguém para recolher. Ir à casa-de-banho também foi uma aventura! Desta vez, não sei porquê, não havia “western toilet”, só o buraco no chão. Estar de cócoras a fazer as minhas necessidades, com um comboio em movimento que me abana o corpo todo de um lado para o outro (e outras coisas mais), a tentar não molhar-me, enquanto me agarro a algo para não cair… Enfim, um filme…

Quando cheguei, reparei que havia duas saídas. Saí para a zona Pahar Ganj (onde eu tinha ficado quando cheguei a primeira vez à Índia). Não vi lá ninguém à minha espera como estava combinado com o Raja… A ida para o aeroporto também estava incluída no pacote que comprei, mas tudo bem… Eu também já não queria ir à agência. Queria mesmo era vir para o aeroporto.

Enfim… goodbye India!

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Capítulo X - Varanasi

Acabei de chegar ao hotel de Varanasi. Acho que este é um dos melhores onde eu já fiquei (pelo menos é o que parece à primeira vista).

Dia 23 de Agosto de 2012 || 8h55 – Varanasi (cidade sagrada)

Acabei de chegar ao hotel de Varanasi. Acho que este é um dos melhores onde eu já fiquei (pelo menos é o que parece à primeira vista).

Ontem, quando ainda estava no hotel de Agra a fazer tempo para apanhar o comboio, o Dimple pediu ao dono do hotel (que estava na recepção) para me dizer que vinha aí chuva da grossa e que por isso era melhor irmos andando. Eram umas 15h e tal e eu só tinha comboio às 20h40. A estação ficava a 1h30 de Agra. Eu só pensava no que é que eu ia fazer estando tanto tempo na estação. E como é que seria a estação?! E como era longe de Agra provavelmente nem sequer ia encontrar lá turistas. Mas pronto, já não queria saber de mais nada e fui. No caminho o Dimple ainda perguntou se estava tudo bem comigo, e no fim lá tentou explicar-me no seu mau inglês que ia pedir a um dos rapazes que trabalha na estação para “tratar” de mim, ou seja, levar-me para o “waiting room” e depois até ao comboio e lugar correcto. Disse-me que só no final é que lhe pagava 100 rupias. Eu fiquei agradecida por isso, porque de facto a estação, apesar de ser pequena, é confusa. Ainda por cima está tudo escrito na língua deles.

Quando cheguei à sala de espera dos estrangeiros fiquei super contente quando vi uma rapariga lá sentada. E quase que chorei quando ela me disse que era brasileira. Eu estava mesmo muito sensível e só precisava de estar com alguém. E ela era uma querida, mais o namorado dela. Ficámos a falar o tempo todo até o comboio chegar. Ela vai noutro comboio, mas também é para Varanasi. Agora só me resta a esperança de voltar a vê-los nas ruas de Varanasi.

Eles contaram-me que estão a viajar há quase 45 dias e que a Índia é o último país que estão a visitar. Ficam só 8 dias e depois voltam para a Tailândia (onde já estiveram e que dizem que é fantástico) e a seguir vão para casa. Disseram-me que eu era muito corajosa por estar a viajar sozinha pela Índia (eu diria parva e louca!), porque de todos os países que eles visitaram (na Europa e Ásia) este está a ser o pior. E também não estão a gostar. Nem das pessoas. Dizem que estiveram noutros países pobres da Ásia e que as coisas não são nada assim. Nem as pessoas. Disseram-me também que se eu conseguisse sobreviver aqui sozinha então conseguiria ir a qualquer lado. Gostei mesmo muito deles e espero voltar a vê-los. Na Índia e fora dela.

Entretanto iam chegando mais turistas. Todos tínhamos comboio para Varanasi, mas ninguém ia no mesmo. Até que chegou um grupo de 3 espanholas que felizmente ia no mesmo comboio e classe que eu. E os lugares eram juntos! Que sorte a minha! O tempo acabou por passar depressa e bem na estação de comboios (o que foi muito bom para mim), a falar sobretudo com os brasileiros, enquanto controlava os ratos que circulavam pela sala. Alguns eram pequenos, e esses andavam por dentro dos tubos das cadeiras, mas também havia uma ratazana. E nos trilhos do comboio então nem se fala! Estavam empestados de ratos!

O comboio chegou – 20 minutos atrasado – e eu lá fui com as espanholas para as camas da 2ª classe. De um lado do corredor há quatro camas (um beliche de cada lado) e do outro só há duas camas, uma por cima da outra, encostadas à parede. E depois há cortinas que fecham cada um desses compartimentos, deixando um corredor com “paredes” de cortinas. O corredor é mesmo muito estreito. Não é para pessoas gordas e para malas muito grandes. O mais prático é de facto a mochila.

Ficámos um pouco a falar e depois tentámos dormir. Eu consegui dormir um pouco porque estava mesmo cansada, mas já me estava a doer o corpo e a começar a ter dor de cabeça. Como era suposto o comboio chegar por volta das 4h40 da manhã, por volta dessa hora preparámo-nos todas para depois sair. No entanto, o comboio só chegou à nossa estação de destino mais de 2h depois. Pelo menos chegámos de dia, mas foi chato termos estado a pé tão cedo, quando poderíamos ter descansado um pouco mais.

Chegadas à estação, elas tinham um motorista à sua espera (como quase todos os turistas), mas eu não… E lá arranjei um táxi por 500 rupias…

Sair da zona da estação foi difícil. Os carros estavam completamente parados e havia imensos camiões. À volta, só lama…

No caminho para o hotel vi barracas. Já tinha visto também em Jaipur, mas aqui parece que as coisas são ainda piores – mais pobre e mais sujo.

Entretanto já fui tomar o pequeno-almoço e falar com um espanhol que estava na piscina. É professor de ioga e já é a terceira vez que vem à Índia. A Varanasi é a primeira vez e diz que está a ser muito difícil, porque Varanasi é pior que Deli. Diz que acha que esta vai ser a sua última viagem à Índia…

Estivemos a falar um pouco sobre isso e de como eu me estava a sentir, até que ele me disse uma coisa muito acertada e que me deixou a pensar durante algum tempo. Ele disse: “estás a lutar contra ti mesma e não o deves fazer. Se não gostas da Índia não há problema. Não tens que gostar, e não tens que lutar contra esse sentimento”…

Dia 24-08-2012 || 9h00 – Varanasi

Ontem fiquei o dia todo no hotel. Como precisava de descansar e o quarto agrada-me (apesar da quantidade de baratas pequenas que tem…). Para além disso, ontem não queria ver nada. Ontem não queria “estar” na Índia… Fui só almoçar à rua com o espanhol que conheci ontem e de resto passei a tarde no quarto a dormir.

Fomos almoçar ao McDonald’s que há aqui perto. Queria ver como era aqui. Bom, até o Mac é diferente. Pedi um menu chicken. Já salivava ao pensar na primeira mordidela que ia dar naquele frango crocante. Mas não. Para além do frango não ser panado, tem ainda um sabor bem indiano e picante! A coca-cola e as batatas fritas eram das pequenas, não sei porquê.

Voltámos para o hotel e só nos encontrámos outra vez ao final da tarde para irmos jantar. O Haceri ainda me deixou usar o seu portátil para enviar um email à minha mãe, uma vez que neste hotel, pela primeira vez, não há internet.

Depois fomos comer a um bar que há aqui ao lado do hotel, muito agradável e nada indiano, e onde parece que é frequentado por indianos mais endinheirados (alguns estavam a fumar xixa, dada pelo bar). Queria comer qualquer coisa que não fosse indiana, mas sem ser a omelete ou uma pizza é difícil.

Hoje vou com ele aos gahts e andar de barco. Vamos lá ver…

17h38 – Varanasi

Já voltámos para o hotel. Ele estava muito cansado. Mas a verdade é que Varanasi também não tem muito para ver.

De manhã andámos de barco (só meia hora), e depois fomos pelas ruas estreitas até ao gaht maior onde se queimam os corpos.

Quando estávamos quase a lá chegar, passaram por nós uns homens que iam a cantar enquanto transportavam um corpo. Os corpos são enrolados num pano branco e depois num outro colorido. Parece que quanto mais velhas são as pessoas mais dourado tem esse pano. O das mulheres é mais para o vermelho. Depois prendem esses panos com umas faixas na zona dos pés e da cabeça (não sei se em mais algum sítio). Quando chegam ao local da cremação os corpos são primeiro mergulhados no rio (para os purificar). Os homens santos, as grávidas e as crianças não são cremados. São logo atirados para o rio porque já estão purificados.

Depois preparam as madeiras (aquilo que a família conseguir pagar). Põem o corpo em cima da fogueira (ainda por acender), só com o pano branco a cobri-lo, e depois põem mais alguns troncos por cima. Incendeiam-no e deixam-no a queimar até se acabar a madeira. Houve um corpo que, acidentalmente, se destapou na zona da cara e do peito enquanto ardia. Os homens ainda o tentaram cobrir, mas acabou por ficar com a cara a descoberto.

Eu até ficaria a ver mais tempo este ritual, mas o Haceri queria ir almoçar. Vimos ainda umas lojas para eu comprar umas calças e viemos embora.

(PS: A família não pode chorar a morte da pessoa porque senão ela não “sobe” para o Nirvana.)

Afinal Varanasi não me pareceu assim tão mau. Não a achei mais suja que as outras cidades que vi (antes pelo contrário; é que também não há muito espaço para acumular lixo), nem com mais gente, nem com mais e piores “perseguidores”. E creio que também não me pareceu tão mal porque aqui está muito calor e por isso as ruas estão secas.

Não sei se também não me pareceu tão mal porque criei uma expectativa muito má; porque já me habituei a isto e já nada me “choca”; ou porque já estou quase a ir para casa e já não quero saber de mais nada…

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Capítulo IX - Agra

Até agora, hoje acho que foi o dia em que eu me senti o mais desconfortável possível.

Dia 21 de Agosto de 2012 || 21h50 – Agra

Até agora, hoje acho que foi o dia em que eu me senti o mais desconfortável possível. Isto porque, antes de chegarmos a Agra, parámos em Fatehpur Sikri (uma cidade abandonada), que em vez de estar cheia de turistas, estava cheia de “local people” devido a uns dias festivos que estão a decorrer (não percebi muito bem…). E foi simplesmente horrível!

O guia disse que eles são “illiterate people” e que não estão habituados a ver brancos. Ora, se já era desconfortável andar nas ruas indianas (seja de que cidade for), aqui ainda foi pior. Olhavam mais, e chegavam até a parar ao pé de nós enquanto o guia nos estava a explicar coisas. E não eram poucos! Houve um miúdo que até teve o descaramento de me passar a mão no rabo! Mas pior ainda foi quando entrámos numa zona sagrada (que era enorme; tinha uma grande praça no centro e uns edifícios a rodeá-la), descalças, claro, e com chuva. Esta praça estava cheia de gente e cheia de pequenas “lojas” montadas no centro. Acho que as únicas turistas éramos nós. Cada vez que o guia parava, um grupo de rapazes rodeava-nos e ficava ali a olhar para nós. Mas esta gente que olhava era diferente dos outros olhares. Estes eram mais incomodativos e “agressivos”. Eu já não queria ver mais nada. Eu só me queria vir embora. E o mais engraçado é que só eu é que parecia estar assim tão incomodada. Mas, de facto, estava-me mesmo a sentir como se estivesse num zoo, em que eu é que estava a ser observada (e bem de perto!).

Para piorar as coisas, estava a chover e eu estava com os pés numa miséria – sujos e tingidos de azul por causa das sandálias.

Chegámos a Agra e já era quase noite (mas também não é por isso que se ligam as luzes dos carros!!!) e… parecia que estava em Delhi outra vez! É que, realmente, a única coisa que a Índia tem para ver são os fortes, os palácios e as imponentes construções que os Marajás construíram no seu tempo. Porque de resto é tudo igual. Basta ir a Delhi para se ver o resto da Índia: caótica, imunda, cheia de gente, pobre, ensurdecedora… Enfim, sinceramente eu ainda não consegui arranjar muitos adjectivos positivos para descrever este país. Até agora ainda não houve nada que me fizesse dizer que não me importaria de vir aqui outra vez, mesmo que fosse para visitar outros lugares… Ou sou eu que sou muito limitada e insensível, ou então não percebo mesmo porque há tanta gente de fora que adora vir cá.

Esta era uma das razões pela qual eu queria vir à Índia – para saber porque há tanta gente que a adora, tendo em conta tudo o que eu já disse para trás. E até estava quase convencida que eu própria ia ser uma dessas pessoas. No entanto, ainda não consegui deixar de estar do lado daqueles que dizem que não gostaram da Índia…

Observações:

  • Aqui passa-se a vida a ver homens a mijar na rua (seja de pé ou de cócoras) e a cuspir (vi um que estava a conduzir uma mota e, em andamento, tirou o capacete – que é raro eles andarem com um –, cuspiu e voltou a colocar o capacete.

  • Quando chove ninguém se protege; as pessoas simplesmente andam à chuva, ficando completamente ensopadas.

  • Parece que o pessoal só acende as luzes dos carros e das motas quando é mesmo já de noite, ou seja, quando já está mesmo escuro, porque até lá andam na estrada como se nada fosse…

  • Aqui, na Índia, não há casas; há “construções” onde as pessoas vivem e pronto…

  • Os homens aqui são super vaidosos, no sentido em que adoram tirar fotos (posam e tudo!).

22-08-2012 || 12h54 – Agra

Eu só quero sair daqui o mais depressa possível! Se eu pudesse ia já para casa. Isto está a ser horrível.

Depois de ter ido ver o Taj Mahal e o Agra Fort esta manhã com as canadianas (Noémie e Daphenie), vim para o hotel ainda não eram 11h (tinha combinado com elas às 6h. Não dormi nada, claro, principalmente porque havia muito barulho exterior).

Quando cheguei o meu motorista pediu-me pelo dinheiro. Eu tinha que pagar 18.360 rupias e dei-lhe 19.000, sendo o resto a sua gorjeta. Pode não ser muito, mas também já não tenho muito mais (e também não posso gastar mais), e além disso não gostei muito do serviço. Para além de ele quase não falar inglês, o que tornou a viagem muito mais difícil (e ainda por cima eu não tinha mais ninguém com quem falar), ele apenas fazia o mínimo que tinha que fazer, ou seja, levava-me de uma cidade a outra, deixa-me nos hotéis e pronto. Eu vi outros condutores que faziam mais do que isso. Para além de que quando eu lhe pedia alguma coisa “extra”, ele não gostava. Tal como aconteceu em Jaipur e no caminho para Agra (porque ele não me queria levar a ver um poço em Abhaneri; disse que não ficava na estrada para Agra).

No entanto, e como eu já deveria esperar, ele não gostou da minha gorjeta e perguntou se ele não fez um bom serviço, se eu não estava contente. E deu a entender (no mau inglês dele) que ele só estava a receber isto pelos dias que esteve comigo. Eu disse-lhe que o resto já tinha pago à agência e que depois eles lhe pagariam pelo seu serviço. Mas parece que não… Já estava a ficar de tal maneira chateada e nervosa que comecei a chorar. Pedi para ele ligar ao Raja (o agente) para eu falar com ele. O Raja tinha-me dito que eu dava a “tip” no final se quisesse. Eu dei, mas parece que há um mínimo que é suposto pagar. Não faço ideia. Não estava a perceber nada, e parecia que a única coisa que ele ia receber era a minha “tip”, que não era muito.

Falei com o Raja e ele disse que eu só dava gorjeta se eu quisesse, e que ele depois falava com o Dimple. Bom, a verdade é que não ficou nada resolvido, porque parece que o Dimple ficou chateado na mesma e sem perceber o que se estava a passar. Eu mostrei-lhe o meu papel da agência (e ao recepcionista) onde estavam os 890€ que eu paguei e tudo o que estava incluído, nomeadamente o condutor. E disse-lhe que uma parte daquele dinheiro era para ele (ou deveria). Ele percebeu que eu dei a sua “tip” ao agente e ainda por cima no início da viagem, quando deveria ser no fim. O problema é que eu já não sabia se estávamos a falar do mesmo. Eu só chorava e ele lá acabou por dizer “no problem”.

Entretanto perguntei ao recepcionista quanto é que as pessoas costumam dar aos condutores. Ele disse que por 14 dias são mais ou menos 2.500 rupias. Por dia é mais ou menos 200. Se eu não estivesse sozinha, e se o condutor tivesse sido como o das espanholas, eu até daria esse dinheiro. Mas como não tenho esse dinheiro, não sabia que havia um mínimo e não gostei por aí além do seu serviço, dei o que pude.

Eu percebo que, segundo a cultura deles, ele se sinta “ofendido”, mas segundo a minha eu não estou a fazer nada de mal. Para além de que ainda não percebi se este dinheiro é mesmo só gorjeta ou se faz parte do “salário” dele.

Enquanto esperava no sofá da recepção que as horas passassem (apesar de, ironicamente, não querer nada ir de comboio para Varanasi), perguntei ao recepcionista se ele sabia como é que eu tinha que fazer para apanhar o comboio certo (isto depois de ele me dizer que costuma andar de comboio). Não me soube explicar nada. Mostrei-lhe o bilhete e tudo, e nada! Como é que isto é possível?! Que frustração! Somebody please take me out of here! I just want to go home… :(

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Capítulo VIII - Jaipur

Eu estou tão frustrada neste momento que só me apetece é gritar!

Dia 19 de Agosto de 2012 || 23h25 – Jaipur (The Pink City)

Eu estou tão frustrada neste momento que só me apetece é gritar!

Acabei de vir do cinema, onde supostamente ia ver os indianos completamente loucos durante o filme (até os franceses me disseram esta manhã que eu tinha que ir ao cinema em Jaipur)… e nada! Nem um som! Aliás, eu já estive em cinemas mais “barulhentos” em Portugal do que aquilo que eu assisti hoje na Índia! Que frustração meu Deus! E aposto que foi porque, mais uma vez, o meu motorista não me levou ao cinema que era suposto! Fomos a um shopping e não a um dos maiores cinemas da Índia, como era suposto (e que tanta gente me disse para ir).

A frustração já começou de tarde, pois o meu motorista não me queria levar a lado nenhum. Chegámos à hora do almoço (isto porque eu disse para sairmos às 9h30 de Pushkar e não às 11h30 como ele tinha dito), viemos ao hotel, ele levou-me a almoçar à cidade e depois – “Ok, let’s go to the hotel”!

“Não, não vamos para o hotel! São 3h da tarde, o que é que eu vou fazer para o hotel?!” Caramba! Que azar que eu tive com o meu motorista! É bom homem, mas mal conseguimos comunicar e ele nunca me leva a lado nenhum (ao contrário do que acontece com outros motoristas). Até nem haveria problema se eu estivesse acompanhada, mas não estou!

Acabei por lhe pedir para ir tirar umas fotos a um lago que Jaipur também tem. Ainda lhe perguntei se podíamos ir a umas ruas com mercado que aparecem no Lonely Planet, mas ele lá arranjou umas desculpas para não irmos.

Depois de tirar as fotos disse-lhe que queria ir a um parque que tinha visto no caminho para o hotel. Fomos primeiro a um que pensávamos que era esse e que ficava ao pé daquele que eu tinha visto. Paguei 10 rupias para entrar numa coisa mínima. Depois lá demos com o outro (bem maior) e paguei 12 rupias. Mas como é que é possível que até a porcaria dos parques se pague aqui neste miserável país?! O que é curioso ver é como é que, até nos parques, existem referências às divindades. Neste, por exemplo, havia várias estátuas. (Ah! E nem um turista! Nem sequer um!…)

Aqui na Índia há templos em cada canto. Mesmo que sejam muito pequeninos e no meio da rua, há sempre um “cornerzinho” com uma divindade.

Hoje não encontrei ninguém (Ah! Outra frustração! Não consegui estar com as espanholas Irene e Leticia. Pedi ao Dimple para ligar para o motorista delas. Parece que ele estava “free” esta tarde e por isso não deu para ir ter com elas… Enfim, só me apetece é gritar com o homem também!). Nem consegui “colar-me” a ninguém. Parece que amanhã vou andar sozinha…

Já estou cansada de estar aqui. Só quero mesmo é ir para casa.

Dia 20-08-2012 || 22h00 – Jaipur

Hoje esteve a chover praticamente o dia todo. E a chover bem. Do género de ter que estar no forte à espera que a chuva passasse, porque, mais uma vez, deixei o guarda-chuva no hotel!

Quando cheguei ao forte (sozinha), mais uma vez tive um tipo a seguir-me o caminho todo enquanto me fazia perguntas. E ainda mal tinha subido o caminho até ao forte. Já estava a ficar tão desesperada que fui ter com o primeiro casal de estrangeiros que vi (italianos) e perguntei-lhes se eles se importavam que eu andasse com eles. Afinal não eram um casal, eram um grupo de amigos. Eles disseram-me que eram 6, mas eu contei 4 rapazes e 1 rapariga. E pronto, ninguém me chateou mais…

Mas depois, quando estávamos à entrada do forte, eles disseram que não o queriam ir ver. E então eu fui sozinha com um guia.

Quando a chuva lá acabou por ficar um bocadinho mais miúda, fui quase a correr para o carro. Fui para o hotel e… meti conversa com uma mãe e filha que estavam sentadas no “lobby” do hotel. São canadianas (do Quebec) e muito simpáticas. E lá consegui arranjar companhia para a tarde, principalmente para ir ver o que não queria ir ver sozinha – o mercado (bazar).

Continuou a chover de tarde. É uma chatice pois não dá para tirar grandes fotos. E torna as coisas ainda mais cansativas. Mas foi fixe. Ainda encontrei os italianos que conheci em Pushkar. Eles vão ficar mais um dia, e vão ao cinema que eu deveria ter ido… Enfim…!

Eram quase 19h quando chegámos ao hotel. Jantei com elas e já combinámos a ida para Agra juntas. Yeah!

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Capítulo VII - Pushkar

Cheguei às 17h00 a Pushkar. Para trás, no caminho, ficaram as espanholas Maite e Lola com quem tive o prazer de ainda almoçar com elas.

Dia 17 de Agosto de 2012 || 18h14 – Pushkar (cidade sagrada)

Cheguei às 17h00 a Pushkar. Para trás, no caminho, ficaram as espanholas Maite e Lola com quem tive o prazer de ainda almoçar com elas.

Pushkar é uma cidade sagrada. Tem um lago onde as pessoas se banham e vêm fazer oferendas. As espanholas tinham dito que lhes chocou imenso esta cidade. Mas também foi a primeira que elas visitaram. Vamos ver como me sinto amanhã.

De momento estou a gostar imenso. Mais uma vez porque estou num sítio rodeado de montanhas, onde o ar é fresco e inspirador. Depois de tudo o que já ficou para trás, estar em locais rodeados pela natureza sabe mesmo muito bem. O hotel onde estou fica num desses sítios, a 10/15 minutos do lago. Tem uma piscina, uma horta, e uma espécie de jardim selvagem onde estou de momento, sentada numa maravilhosa cadeira de baloiço.

É realmente muito engraçado como as coisas são. De facto, não há nada como ver o pior para se apreciar de verdade o que se tem. Ou mesmo apreciar pequenas coisas como este baloiço onde me encontro, com vista para o que o mundo tem de melhor (a natureza), e ouvindo pássaros em vez de ensurdecedoras buzinas.

Dia 18-08-2012 || 21h43 – Pushkar

Hoje andei com o Roberto e a Francesca. Tinha que me colar a alguém! Não consegui ontem à noite, nem hoje de manhã no hotel, por isso à primeira oportunidade – “Do you mind If I walk with you?”.

Foi num dos gahts* que eu os conheci. Antes já tinha saído do hotel sozinha e andados uns 10/15 minutos a pé até onde os encontrei. Já estava assustada, claro! Houve um indiano que me “seguiu” praticamente desde o hotel até ao sítio onde parei a primeira vez – o gaht. E depois é o costume: os olhares, os miúdos a pedirem-te comida, as abordagens, enfim. Eu só queria arranjar companhia o mais rapidamente possível!

E ainda bem que o fiz, pois consegui andar pela pequena cidade quase toda e tirar bastantes e boas fotografias, o que não aconteceria se estivesse sozinha.

Afinal não fiquei chocada como as espanholas. Porque, afinal, tudo isto é mais do mesmo… Acho que é mesmo como diz o ditado: primeiro estranha-se e depois entranha-se. De certa maneira lá acabamos por nos habituar ao caos, à sujidade, ao barulho, etc. O que não deixa de ser cansativo na mesma…

Foi interessante ter chegado a uma cidade sagrada. Pushkar tem um lago (castanho, diga-se) onde todos os dias os indianos se banham e fazem oferendas.

Portanto, uma vez que um turista não é hindu, não faz sentido rezar ao(s) deus(es) deles e fazer oferendas, certo? Errado. É que é isso mesmo o que eles querem. Assim que podem dão-te logo para a mão umas pétalas de rosa que dizem que é para tu atirares ao lago sagrado. Até aqui tudo bem. O problema é que logo a seguir vem um “priest” ajudar-te a fazer a oferenda. Ou seja, rezas com ele e fazes o ritual que ele te pede, e quando dás por isso já tens um prato de oferendas ao teu lado. E porque é que eles querem que um turista que não é da religião deles faça isto? Dinheiro, claro! Portanto, como diria um americano “sacred my a**!”. Ou como diz uma famosa canção: “it’s all about the money…”

Então afinal onde está a espiritualidade? Mas depois, como é um lugar sagrado, não podes tirar fotografias… Enfim, quanto mais vejo e aprendo menos acredito na(s) religião(ões).

À tarde já estávamos os três bem cansados e já não sabíamos aonde ir (já não havia mais nada para ver). Eles foram muito simpáticos e vieram comigo até ao hotel, e amanhã vão para Jaipur.

Entretanto, quando cheguei ao hotel, encontrei a família francesa que tinha conhecido no camel safari! É muito giro quando isto acontece, e eu fico muito contente quando encontro caras “conhecidas”.

Observações:

  • Eu nem acredito que aqui também se pagam estradas! É que algumas parecem mais caminhos de cabras e outras nem sequer existem!

  • Tenho visto homens nas ruas de cócoras. Parece que estão a fazer xixi, mas é estranho porque os homens fazem-no de pé. Perguntei ontem à italiana se sabia o que faziam. Disse-me que são muçulmanos e que, para eles, só os animais fazem xixi de pé, daí eles fazerem-no assim…

  • Desde que saí de Bikaner que todos os hotéis onde vou têm o duche no chão da própria casa-de-banho, ou seja, não há banheira nem nada físico que separe o chuveiro do resto da casa-de-banho. Para além disso, os chuveiros, como não são limpos, deitam água só de alguns buraquinhos (o que torna difícil tirar o champô), e depois alguns ainda disparam para o resto da casa-de-banho. Ontem (em Pushkar), havia um que ia direitinho aos interruptores e à tomada!

  • Cheguei hoje (dia 19) ao hotel de Jaipur, e é a primeira vez que vejo mulheres a trabalhar num hotel.


*Nota: Os gaths são conjuntos de degraus que terminam num rio, onde as pessoas se banham, fazem oferendas ou cremações. Os mais famosos são os de Varanasi.

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Capítulo VI - Udaipur

Hoje o caminho para Udaipur foi longo.

Dia 15 de Agosto de 2012 || 23h10 – Udaipur (The Lake City)

Hoje o caminho para Udaipur foi longo. Primeiro porque havia uma estrada que estava completamente destruída pela chuva e o trânsito estava parado por isso. Até que conseguimos mudar de caminho. Não melhorou assim tanto (não havia era camiões), até porque, da maneira como é a Índia, chove torrencialmente por uma hora e fica logo tudo num caos. Segundo porque parámos num templo lindíssimo a caminho daqui. E pela primeira vez vi um pouco de “espiritualidade” quando um dos “padres” do templo se pôs a ensinar a uns turistas como meditar. E então, em posição de ioga sentado, lá se pôs a entoar um cântico muito agradável de se ouvir.

Mas melhor que isto, para mim, foi o caminho que fizemos do templo até Udaipur – entre montanhas e verde. Muito verde! Foi lindo. Parecia que nem estava na Índia. Que paisagens deliciosas. O ar era fresco e por isso fomos o resto do caminho de janelas abertas. Realmente começo a chegar à conclusão que estar entre a natureza é que é viver um momento de verdadeira espiritualidade.

Até ao templo fomos sempre atrás do carro das espanholas. No caminho encontrei a espanhola com quem estive a falar ontem à noite no hotel em Jodhpur, mais a amiga com quem viaja. E foi com elas que acabei por passar a noite (estamos no mesmo hotel). E amanhã vou visitar a cidade com elas. Isto porque o meu motorista viu que eu também as conhecia, e então já não ligou para o motorista das outras. Enfim, eu já não digo nada. Eu só não quero é estar sozinha.

Dia 16-08-2012 || 23h00 – Udaipur

Udaipur foi das cidades que eu mais gostei até agora. Talvez porque tem um lago, talvez porque está entre montanhas, ou talvez porque foi a cidade que algumas vezes me pareceu menos com a Índia caótica e feia que tenho conhecido.

Hoje estive com as espanholas Maite e Lola. De manhã fomos a um pequeno parque que os nossos condutores nos levaram. E depois ficámos por nossa conta. Fomos ao city palace, o palácio principal da cidade, e que eu gostei muito. Já era hora do almoço, mas ainda fomos a um templo que está mesmo ao lado. Enquanto elas ficaram a ouvir os cânticos eu fui tirar fotos com o maquinão da Maite, porque entretanto já tinha ficado sem bateria na minha máquina fotográfica.

Fomos almoçar a um roof top restaurante, como todos os que há aqui (e nas outras cidades também), e pela primeira vez conheci um casal (já adulto) de portugueses!!! Mal percebi que estavam a falar em português fui logo ter com eles! E ficámos a conversar um pouco. Que bem que me soube falar um bocadinho de português em terras indianas.

Depois do almoço fomos andar de barco pelo lago da cidade (adorei! adoro a água…). Queríamos deixar o resto do dia para passar nas ruas estreitas de Udaipur, cheias de pequenas lojas feitas especialmente para os turistas. No entanto, o senhor do tuc-tuc que nos levou e trouxe até ao barco fez a sua última paragem na loja onde o seu filho vendia pinturas em miniatura (só podia!). Ficámos mais de uma hora (serviram-nos chá), e já muito estoiradas acabámos por levar uns “regalos para nosotras” para pôr em casa. Entretanto já eram quase 19h e esta era a hora para irmos ver umas danças tradicionais. Eu queria ir pelas ruas adentro, ver mais lojas, tirar umas quantas fotos, trocando as danças por isto mas elas não. O problema é que eu tinha medo de me perder sozinha porque isto é muito confuso. No final, não fui nem ver mais lojas, nem às danças porque não me apeteceu. E agora arrependo-me de não ter feito nem uma coisa nem outra (elas encontraram a Leticia e a Irene nas danças).

Amanhã vou a Pushkar sozinha (oh). E agora só encontro a Leticia e a Irene em Jaipur no 2º dia (se o meu condutor quiser!), e a Maite e a Lola no voo para casa.

Espero continuar a ter sorte, e conseguir arranjar companhia para o resto dos meus destinos: Pushkar, Jaipur, Agra e Varanasi. A verdade é que estas companhias têm sido ouro para mim.

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Capítulo V - Jodhpur

Cheguei ao hotel de Jodhpur. É simplesmente… horrível! Tal como a cidade. Parece Delhi, mas de uma outra maneira. As ruas e estradas estão completamente alagadas!

Dia 13 de Agosto de 2012 || 17h20 – Jodhpur (The Blue City)

Cheguei ao hotel de Jodhpur. É simplesmente… horrível! Tal como a cidade. Parece Delhi, mas de uma outra maneira. As ruas e estradas estão completamente alagadas! Choveu muito hoje e o facto de haver por todo o lado rios de água lamacenta ainda torna a cidade mais caótica e horrível do que já parece ser.

No caminho para cá fiz amizade com duas espanholas. O condutor delas conhece o meu e por isso parámos nos mesmos sítios. Ao almoço sentei-me com elas. Estão praticamente a fazer o mesmo tour que eu, nos mesmos dias. A diferença é que de Udaipur para Jaipur eu paro no meio em Pushkar e elas em Bundi. E depois de Agra eu apanho o comboio e elas continuam de carro até Varanasi, parando primeiro em Khajuraho, e depois vão de avião até Delhi. Mas espero mesmo que dê para estar com elas nas cidades em que coincidimos. Pelo menos hoje o meu condutor vinha atrás do carro delas. Elas foram para outro hotel aqui perto e daqui a pouco vou-me encontrar com elas.

(PS: este hotel não tem água quente, não tem toalhas nem sitio para as pendurar, e nem dão sabonete para lavar as mãos.)

Dia 14-08-2012 || 23h47 – Jodhpur

Começando pelo final do dia de ontem, bom, acabei por não estar com as espanholas porque o meu condutor não percebeu nada do que o outro lhe disse. De qualquer forma (e já estava eu desesperada porque não sabia o que fazer sozinha neste hotel horrível), de repente, quando ia eu sair para (supostamente) ir ter com as espanholas, chega ao hotel o casal de italianos que eu conheci em Jaisalmer! Que alegria! Fiquei com eles o resto do dia e foi muito bom.

Entretanto, quando me ia deitar, e quando pensava que a coisa não poderia piorar mais, o meu telemóvel pifou!!! Eu ainda nem acredito. Porquê??!! E o pior é que o telemóvel de toda a gente funciona! Enfim, já nem quero pensar mais nisso…

Hoje passei o dia todo com as espanholas e foi muito fixe. Fomos de manhã ao forte e depois o motorista delas levou-nos até ao mercado (o meu ia atrás). Foi a 1ª vez que estive fora de um sítio turístico. Claro que é horrível como qualquer outro sítio, mas foi muito interessante. Ainda comprei o chá deles (Masala) porque fiquei fã!

Depois fomos almoçar a um sítio que o condutor delas nos levou (é sempre assim; que sorte que tiveram…), e depois eu e a Leticia fomos a uma loja de antiguidades. Espetacular! Com portas e móveis antigos. Mesmo muito bonito.

Como ainda era cedo e já não havia mais nada para ver, elas foram para o hotel e eu perguntei se também podia ir com elas e ficar por mais um tempo (ainda eram 17h). Bom, realmente viver com luxo é outra coisa. De facto há que experimentar de tudo (e eu acho que o estou a conseguir um pouco aqui na Índia), mas ir no final do dia para um hotel que tem quartos que parecem mini-apartamentos com tudo de bom e do mais bonito é outra coisa…

Às 19h vim-me embora (com muita pena minha) para o meu hotel. Quando estava a jantar sozinha vi outra rapariga na mesa ao lado que também estava sozinha. Meti conversa com ela (é espanhola, por supuesto!), mas cedo descobri que está a viajar com uma amiga.

Falámos bastante, e continuámos a conversa no meu quarto (que entretanto já é outro porque não aguentava estar naquele; puseram-me noutro maior no mesmo piso; eu queria mesmo era ir para o último andar que, comparado com o que tenho, parece um luxo!). Descoberta fantástica: elas vão no mesmo voo que eu!!! Já estivemos a falar para ver se conseguimos ir juntas.

Amanhã vou continuar o meu dia com as espanholas e o seguinte também (iupi!), mas depois infelizmente não as vou ver mais (snif). São muito simpáticas. Ainda bem que as conheci e a toda a gente que tenho conhecido até agora. De facto, têm sido todas “muy amables” comigo.

Ah! Esqueci-me de dizer que choveu a porcaria do dia todo!

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Capítulo IV - Jaisalmer

A viagem de Bikaner até Jaisalmer foi, mais uma vez, de paisagens áridas. Saímos às 9h30 e chegámos lá para as 16h e qualquer coisa. Desta vez não passámos por nenhuma grande zona de casas.

Dia 04 de Agosto de 2012 || 19h00 – Jaisalmer (The Golden City)

A viagem de Bikaner até Jaisalmer foi, mais uma vez, de paisagens áridas. Saímos às 9h30 e chegámos lá para as 16h e qualquer coisa. Desta vez não passámos por nenhuma grande zona de casas. Mas quando isso acontecia, a vista era sempre a mesma: “casas” feitas à beira da estrada, muita terra/lama, lixo, vacas, etc. Apesar de eles ficarem contentes com a chuva, a verdade é que a Índia não tem condições para a receber. Claro que quando chove é com muita intensidade, mas fica logo tudo alagado.

Durante a viagem, para além de ter continuado a ver muitas, muitas vacas (das quais nós temos que nos desviar), camelos a puxar carroças e camiões cheios de gente (tão cheios que se houvesse uma travagem violenta haveria logo uns quantos que seriam cuspidos do camião), vi também “peregrinos”. Já tinha visto ontem, mas hoje havia muitos mais. Quando pergunto o Dimple diz-me que vão para o templo, mas a verdade é que nem ontem nem hoje vi qualquer templo… E o mais estranho é que eu vi, no princípio, uns a caminhar no sentido em que eu ia, e depois vi outros a caminhar no sentido contrário e, portanto, presumi que o templo estivesse no meio. Mas não…

Ainda vi ao longe um edifício que achei que poderia ser o templo, mas o Dimple disse-me que não. Eu acho que ele me disse o que era esse edifício, só que, para variar, eu não percebi. Mas para além disto, o mais estranho ainda foi ver, a partir de uma certa altura, e à beira da estrada, sapatos. Muitos sapatos. Mas mesmo muitos sapatos! Perguntei. Não percebi se ele sabia o que era, se eu é que não lhe consegui perceber, ou se de facto ele também não sabia porque estavam ali os sapatos. Sem pessoas… Sem templo…. Só mesmo os sapatos…

No caminho parámos uma vez a meio da manhã para tomar algo, e eu bebi um iogurte com lassir de manga (acho que é isto). Soube-me bem, mas, não sei se foi isso ou o jantar da noite anterior, ou o pequeno-almoço de hoje, que me levou direitinha à casa-de-banho na paragem seguinte para o almoço. (Aqui já havia sanitas.) E o problema não era só esse. Eu também não me estava a sentir muito bem disposta. E só me apetecia comer torradas, ou algo assim, mas sabia que também não podia comer pouco porque tão cedo não ia comer outra vez. Decidi pela omelete de queijo com tostas. Estava quase no final e ainda não me sentia bem. Pedi uma Coca-Cola (por causa do gás e do açúcar) e voilá, comecei a arrotar e acabei por ficar bem! Quando fui para o carro tomei um anti-diarreico (just in case, pois não quero ter de sair do carro a correr para ir para o meio do nada despejar a minha dor de barriga!).

Antes de chegarmos a Jaisalmer o meu motorista avisou-me: amanhã vou para o forte sozinha (a pé) e não falo com ninguém! Se alguém me perguntar alguma coisa digo que não sei ou não respondo (tipo, de onde és, quantos dias vais ficar, etc). E não vou a mais lado nenhum sem ser ao forte. À tarde ele leva-me ao “camel safari”. Ok!

Chegámos a Jaisalmer e… tenho que dizer que esta seria uma cidade muito bonita se não fossem as típicas peculiaridades que caracterizam a maior parte das “paisagens” da Índia… Isto porque o tipo de construção e cores utilizadas (dentro dos amarelos) são muito bonitas e interessantes, mas claro, não há passeios, não há ruas, não há mais nada sem ser pessoas, vacas, cães abandonados e lama, muita lama.

O hotel onde fiquei tem mais do que um edifício e eu fiquei naquele onde não está o restaurante. Ou seja, para ir jantar ou tomar o pequeno-almoço eu tenho que andar a pé, por uma ruela que não inspira confiança, até ao edifício principal. Não gostei e disse que queria ligar ao meu agente. Eles lá falaram uns com os outros e com o meu motorista e depois disseram-me que esta noite ficava no edifício onde estou e amanhã (depois do “camel safari”) põem-me noutro. Ok. “E como é que eu faço para jantar hoje? É que eu não quero andar sozinha de noite na rua!” Dizem que há um restaurante bom e muito perto onde estou a dormir. Ok.

Entretanto peço para ligar para casa. Não dá. E internet? Estava a sala cheia (de indianos). Dizem ao meu motorista para tentar noutro sítio. Era só de internet. Falaram-lhe noutro. Uma lojinha de cadernos de um senhor que tinha um telefone com um “meter”. Porreiro! Consegui falar com a minha mãe!

Venho-me embora com o Dimple para o hotel, para ele me mostrar o restaurante. Mas, ao chegar, vi um casal de italianos a fumar cá fora. Comecei logo a falar com eles e a perguntar se não se importavam que eu fosse jantar com eles (também iam ao tal restaurante). Tudo bem! Fiquei à conversa com eles e combinámos às 20h irmos jantar.

Dia 12-08-2012 || 23h20 – Jaisalmer

A noite de ontem e o dia de hoje foram muito bons. Isto porque estive com outros turistas. Apesar de que também gostei muito da cidade.

Ontem à noite fui jantar com os italianos. Muito simpáticos, e o restaurante era muito agradável. E quando chegámos ao hotel conhecemos um casal de espanhóis (muito novos). Não havia luz na cidade (já começa a ser hábito em qualquer lado), e por isso ficámos na entrada a falar, e depois no telhado/terraço do hotel. Os espanhóis também são muito simpáticos e estão a fazer a viagem à Índia com eu pensava fazer – com alguns bilhetes de comboio já comprados e o livro da Lonely Planet como guia (toda a gente o tem!). Como eles também iam visitar o forte esta manhã perguntei se podia ir com eles, mas na recepção não me deixaram cancelar o guia. Ainda perguntei se eles queriam vir comigo, mas a rapariga não falava muito bem inglês e por isso não quis ir.

No entanto, a visita ao forte com o guia foi muito boa. Pela primeira vez consegui perceber quase tudo o que ele dizia! A meio da visita, como tínhamos que esperar pelas 11h para ir a uns templos dentro do forte, ele levou-me à sua casa e a sua mulher serviu-nos chá (não me recordo do nome, mas é um chá deles muito bom).

No final da visita (que estava combinada pelo hotel custar 300 rupias) dei-lhe 400 rupias. 100 a mais porque tinha gostado da sua tourNo entanto, e como eu já deveria esperar, ele fez uma cara descontente por eu lhe estar a pagar só aquilo…

Por acaso isto é uma das coisas mais chatas que os indianos têm – estão sempre à espera de mais. Nunca é suficiente. Bolas, nem todo o europeu que viaja é rico! Isto é cansativo.

Quando íamos para o hotel encontrei os espanhóis e aproveitei e fui almoçar com eles num restaurante aconselhado pelo Lonely Planet, claro! Era bom.

Às 15h fui com o Dimple até ao camel safari. Uma hora de caminho.

Quando cheguei ao local já lá estava uma família de franceses e logo a seguir chegou um casal de italianos. Aproveitei e meti logo conversa com todos eles! E depois, claro, lá vinha a pergunta que todos os outros turistas me fazem: porque é que eu estou a viajar sozinha? Sinceramente, já nem eu sei! Só sei que quero voltar para casa o mais depressa possível. Apesar de estar tudo a correr bem, e de haver coisas interessantes para ver, confesso que isto está a ser um pouco difícil para mim. Mais do que eu estava à espera. E estar no “mundo” dos indianos é muito cansativo (por várias razões…).

Os camelos já estavam prontos, mas como íamos ficar no deserto a fazer tempo para ver o pôr-do-sol decidimos esperar um pouco mais no local onde estávamos.

Na verdade, aquilo a que se pode chamar de “deserto” é apenas uma pequena parte do terreno árido de Jaisalmer.

No entanto, o passeio de camelo (de quase uma hora) foi muito agradável (à parte que o meu “condutor” de camelos estava sempre a olhar para mim – um velho com turbante. Estes olhares são de facto muito desconfortáveis…).

No fim, esperámos pelo pôr-do-sol, mas como este estava completamente tapado por nuvens, desistimos e viemos embora. Voltámos para o mesmo sítio onde, juntamente com outros turistas, jantámos enquanto uns indianos dançavam e tocavam música. Depois houve quem ficasse porque ia dormir no deserto sob as estrelas, mas eu já tinha decidido vir para o hotel. E ainda bem que o fiz, pois estava a desesperar para tomar banho e porque aqui descanso melhor.

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Raquel Dominguez Raquel Dominguez

Capítulo III - Bikaner

Mais uma vez dormi muito mal. Os ares condicionados ou as ventoinhas dos hotéis fazem muito barulho. E, ou se dorme com o barulho, ou se dorme com o calor. Até podia dormir na viagem porque são sempre mais de 4h de viagem, mas não quero dormir no carro…

Dia 10 de Agosto de 2012 || 23h30 – Bikaner

Mais uma vez dormi muito mal. Os ares condicionados ou as ventoinhas dos hotéis fazem muito barulho. E, ou se dorme com o barulho, ou se dorme com o calor. Mas dormir com o barulho às vezes também implica levar com o ar frio na cara. Até podia dormir na viagem porque são sempre mais de 4h de viagem, mas não quero dormir no carro…

Saímos às 9h00 e chegámos a Bikaner por volta das 13h15. O condutor parou a meio num desses pontos de comércio e comida para turistas. Comi torradas!

O caminho de Mandawa até Bikaner não tem muito para ver. É sobretudo uma paisagem de vales áridos. De vez em quando lá se passa por casas à beira da estrada e pouco mais.

Chegando a Bikaner fomos ao hotel. E como eu ainda não tinha fome fomos até ao forte (que é o ponto turístico daqui). Como o forte é grande e eu não queria ir sozinha paguei a entrada ao motorista para ele ir comigo. 200 rupias para mim e 30 para ele!…

Na entrada do forte, depois de já termos os bilhetes, estava uma fila de rapazes à espera para entrar, mas o meu motorista (que se chama Dimper ou Dimple…) passou à frente (?!) e entrámos. Penso que esses rapazes estavam numa visita de estudo e, não sei como, acabei por ficar também com o guia deles.

A visita foi interessante, mas mais uma vez não percebia muito bem o que o guia me dizia em inglês… Este sabia falar, mas o problema dos indianos é o sotaque. É difícil perceber o que dizem em inglês.

No final da visita, claro, o guia ficou à espera da gorjeta. Dei-lhe 10 rupias e ele ficou a olhar para a nota, para mim e para o condutor…. Perguntei ao condutor o que se passava e se deveria dar mais. Disse que pelo menos dão-se 100 rupias. 10 rupias é para os rapazes dos hotéis que nos levam as malas para o quarto. Ah! Ok!…

Seguimos para o hotel outra vez e fui almoçar. Mais turistas! Mas passado pouco tempo mandaram sair os turistas porque precisavam da sala para um grupo de indianos que vinha aí…. Levaram-me até a um quarto, e logo de seguida um casal de espanhóis. Ficámos os três a comer no quarto ao pé da cama, numa mesa baixa com sofás. Para mim foi maravilhoso porque pus-me à conversa com eles. Falar com outros turistas é quase como uma lufada de ar fresco!

Depois de comer fui com o condutor até ao templo dos ratos. Aquele onde os ratos são sagrados e lhes dão de comer. Bom, para templo, era muito feio (visto de fora). Aqui na Índia o que não falta são templos e costumam ser mais interessantes.

O templo fica num recinto onde há comércio há volta para comprar as oferendas. E há também um sítio para irmos deixar os sapatos… “Ainda bem que estou de meias”, pensei. Mas, por acaso, e a mim, o rapaz deu-me uns daqueles chinelos dos hotéis. Graças a Deus que me deu isso! É que, neste templo, os ratos estão soltos e andam pelo templo todo, onde as pessoas também andam… descalças! É simplesmente nojento! Muito mesmo! E se por fora o templo não era nada de especial, por dentro então era horrível! Imundo, e sem nada para ver a não ser milhares de ratos a comer, e alguns já mortos por aí.

Não fiquei lá muito tempo, até porque o templo não tem nada para ver. Quando saí vi uns turistas a entrar e reparei que o rapaz estava descalço, sem meias. Estive quase para lhe dizer para não entrar assim, mas ele ia perceber isso logo à entrada.

Voltámos para o hotel e logo a seguir levantou-se muito vento, poeira, e começou a chover. Parece que foi o primeiro dia de chuva há mais de 1 ano e eles estavam contentes por isso.

Descansei um pouco e fui ver se comia qualquer coisa. Encontrei os espanhóis outra vez e sentei-me com eles. Entretanto já tinha tentado duas vezes ir à recepção para ver se conseguia falar com a minha mãe. Não consegui. Perguntei se era fácil para mim arranjar um cartão para o meu telemóvel. Parece que não. Aqui, para se comprar um cartão tem que se dar a nossa identificação, e tem que ser uma identificação de cá (da zona onde se vive). Como não estava a ter sucesso, o recepcionista (ah! parece-me que na Índia só trabalham homens nos hotéis…) levou-me até ao patrão dele, que se apresentou como sendo o dono do hotel (apesar de ser bem novo). Disse-me que me ajudava a arranjar um “SIM Card” e pediu-me o meu passaporte.

Fui jantar. Quando voltei ele ainda não tinha o cartão. Fui então à sala da internet. Ele foi comigo e… ficou lá comigo enquanto eu estive no computador. Pagavam-se 60 rupias por uma hora ou 30 por meia-hora. Ele disse-me que era grátis para mim…. Hum, pois. Então acabei por só mandar um email para a minha mãe e fui-me embora. Ele disse-me que depois ia ao meu quarto para me dar o cartão. E veio.

Bateu à porta. O problema deste hotel é que a chave que tranca a porta está junto com o cartão que acende as luzes. Ora, isto quer dizer que, ou acendemos as luzes, ou trancamos a porta às escuras… A minha sorte é que eu trouxe uma pequena lanterna. Então, enquanto o chefe estava a bater continuamente à porta, eu estava a tentar tirar a chave do cartão para não ter que lhe abrir a porta com o quarto às escuras.

Não consegui. Mas ele, entretanto, tentou abrir a porta… Lá tive eu que tirar o cartão da ranhura, ficar às escuras, abrir a porta com a lanterna, e voltar a pôr o cartão na ranhura.

Ele entrou logo para o quarto. Fiquei apreensiva. Pediu-me o telemóvel e pôs o cartão da Vodafone que ele trazia. Não deu. Mas enquanto tentava ia-me perguntando coisas. E, claro, as perguntas são sempre as mesmas: O que é que fazes em Portugal?; És casada?É a primeira vez que vens à Índia?; etc. Ainda por cima ele não era casado, nem tinha namorada. Medo! Mas pronto, o cartão não deu e ele lá acabou por se ir embora. Deu-me um passou-bem e… um abraço e um beijo! (“Vai-te embora, por favor!”)

Agora, para além do meu telemóvel ainda não dar, está a ficar sem bateria e aqui não o consigo carregar porque as tomadas são diferentes. Enfim… welcome to India.

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Raquel Dominguez Raquel Dominguez

Capítulo II - Mandawa

Saí às 9h00 do hotel em Delhi com o motorista de turbante que me vai levar pelo Rajastão fora. Continuo nervosa e cheia de medo.

Dia 09 de Agosto de 2012 || 18h20 – Mandawa

Saí às 9h00 do hotel em Delhi com o motorista de turbante que me vai levar pelo Rajastão fora.

Continuo nervosa e cheia de medo.

A viagem até Mandawa, uma vila antiga, levou 7h30. Parámos no caminho para almoçar, num sítio à beira da estrada que está feito especialmente para os autocarros turísticos levarem os turistas a comer.

Que miragem! Pela primeira vez vi uma série de turistas! Só me apetecia dizer “Can I stay with you?”. O meu motorista não fala muito (quase nada). Ele não sabe muito inglês e por isso o caminho foi todo feito em silêncio, apenas com o rádio a tocar que eu pedi para ligar ao sairmos de Delhi.

A viagem foi… uma mistura de emoções. Primeiro, o medo de que me acontecesse alguma coisa. Segundo, o choque do que ia vendo ao longo do caminho. Terceiro, o desespero porque tinha fome; porque queria beber, mas não queria correr o risco de ficar com vontade de ir fazer xixi; porque nunca mais chegávamos; e porque o meu telemóvel não tem rede…

Curiosidade: as estradas também se pagam aqui. Mas chamar alguns destes “caminhos” de estradas é muito. Algumas estavam inundadas com a chuva. E a saga do caótico trânsito continuava. Primeiro foi em Delhi. Não tem explicação! Um autêntico mar de carros completamente descontrolado. Depois foi nas “estradas” secundárias. Aqui na Índia não há faixas de rodagem “uma para cá e outra para lá”. Não. Há uma só estrada por onde tudo o que anda circula, e ponto! Aqui até os camelos andam na estrada a puxar carroças. E vacas? Muitas! Muitas vacas. Agora sim vi muitas vacas, e algumas são tão magras quanto as pessoas que as alimentam…

De resto, era assustador ver uma “extensão” das ruas de Delhi pelas beiras da estrada. A degradação, a sujidade, o lixo, a pobreza. Tudo isto em pequenas “ilhas” isoladas ao longo do caminho, separadas por vastos “campos”, alguns agrícola.

A meio da manhã o condutor parou e comprou-me umas bananas. Cada vez que ele parava para fazer alguma coisa (pôr gasolina, encher os pneus, fazer uma mijadinha, etc.) o meu coração acelerava: “O que é que ele vai fazer?”

O tal restaurante onde parámos para comer (ele também comeu ali, mas noutro sítio) era de self-service e custou-me 400 rupias. Fui à casa-de-banho “she” onde, pela 1ª vez, fiz xixi para um buraco no chão (era louça sanitária, mas no chão, com um sítio para pôr os pés). À porta estava um homem a dar guardanapos. E lá dentro a única iluminação que tinha era apenas a luz do dia que entrava pela porta.

Em certas partes das estradas havia também uma cancela (como aquelas que há nas nossas portagens). De um lado tinha uma pedra enorme presa à cancela; do outro um homem que segurava a cancela com uma corda para ela não subir…

A estrada que nos trouxe até Mandawa era estreita, do tamanho de uma faixa de rodagem, mas onde de vez em quando passava um carro no sentido contrário ao nosso. Este caminho ficava num vasto campo, isolado de tudo.

Quando chegámos à vila o motorista andou às voltas a perguntar onde era o hotel. E enquanto ele procurava eu perguntava a mim mesma porque raio é que o Ravi quis que eu visitasse este sítio. Aliás, o que eu perguntava a mim mesma era: “o que é que eu estou aqui a fazer?” e “oh, meu Deus, mas em que raio de hotel é que eu vou ficar?”.

Entretanto, quando já faltava pouco para chegarmos ao hotel (mas eu ainda não sabia disso), entra um rapaz no carro e senta-se ao lado do motorista. Medo! Não pergunto nada e vejo o que acontece…

O rapaz trabalha no hotel e levou-nos até lá.

Na recepção deu o voucher ao senhor. Ele pede-me o meu passaporte. Pergunto se depois mo dão e dizem que sim, depois de 5/10 minutos. Vou à procura do meu motorista. Afinal tenho que combinar com ele por causa de amanhã (e ter a certeza que ele passa a noite neste hotel). Diz-me que às 9h00 saímos.

Entretanto mostram-me o meu quarto. O hotel é bem pequeno e tem os poucos quartos existentes à volta de um pátio interno. O edifício tem ar de ser antigo. As portas de entrada para os quartos são como as dos castelos, mas mais pequenas. A da casa-de-banho também.

O quarto era quente. Ligaram as ventoinhas do tecto e mostraram-me as instalações. De repente perguntaram-me se eu queria um quarto com ar condicionado. Disse que sim. No quarto seguinte disseram-me que eu só tinha que esperar que viessem limpar a casa-de-banho. Ficou na mesma… É… nojento… Ainda bem que eu trouxe uma toalha. E um lençol e uma fronha.

Peço o passaporte ao rapaz. Agora já pela segunda vez. A resposta é sempre a mesma, mas agora digo que não espero. Quero o passaporte comigo! Dão-me o passaporte.

Perguntaram-me se quero ir visitar a vila e se quero que um dos rapazes vá comigo. Pergunto se tenho que pagar. Dizem que dou se eu quiser. Ok, vamos à “cidade”. (O problema do dinheiro é porque não tenho mesmo, principalmente notas pequenas.)

Afinal até tem umas coisas interessantes. São basicamente casas antigas com pinturas lindíssimas. E é neste passeio que vejo mais… turistas! Oh! Aqui estão vocês. Mas não no meu hotel, claro. Aliás, neste hotel de meia dúzia de quartos estou só eu. O rapaz disse que iria chegar um grupo no final do dia. Mas já são 21h20 e eu ainda não vi nem ouvi ninguém…

A visita foi rápida. Eu até queria ver mais, mas sozinha não me atrevi. E até havia mais para ver…

Volto para o hotel com o rapaz (depois da visita guiada da qual eu não percebi nem um quarto do que ele dizia em inglês) e… pareceu-me que ele estava à espera de gorjeta (como todos parecem estar!). Não dei nada, mas fico a pensar nisso. Só tenho notas de 100! Não lhe vou dar 100! Não lhe vou pedir troco!

Lá descobri uma nota de dez, e passadas umas duas horas vou à procura do rapaz. No pátio vejo que uma das portas abertas dá para uma sala de jantar que até está com mesas postas (penso se será para o tal grupo que vem aí…). Pergunto isso mesmo, se é para alguém que vem comer. Como o inglês de todos eles é péssimo o rapaz responde-me dizendo que eu posso comer ali. Não sabia que serviam jantar aqui. Um outro rapaz traz-me o menu. Parece-me bem. Até porque são preços que eu ainda posso pagar com o pouco dinheiro que me resta. Peço arroz com legumes. Ainda bem que consegui jantar. Já estou a começar a ficar farta das bolachas. Mas confesso que me têm salvado a barriga.

Tomo banho (aos bocadinhos porque não tenho água quente outra vez) ao mesmo tempo que vou matando umas espécies de formigas que estão por toda a casa-de-banho.

Amanhã é às 9h00 outra vez.


Nota: Mais uma vez a foto de capa que coloquei para este texto não é referente ao local que descrevo.

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Raquel Dominguez Raquel Dominguez

Capítulo I - Delhi

Nem sei o que dizer ou escrever. Índia é… o fim do mundo! Que ingenuidade a minha pensar que poderia fazer esta viagem sozinha.

Dia 08 de Agosto de 2012 || 19h00 – Delhi

Nem sei o que dizer ou escrever. Índia é… o fim do mundo! Que ingenuidade a minha pensar que poderia fazer esta viagem sozinha. Isto não é coragem. É loucura mesmo! E a loucura paga-se!

Mas vou começar pelo princípio. Pelo voo do Dubai para Delhi.

O avião era igual ao outro, mas desta vez não trazia portugueses. Nem na tripulação. Ao meu lado sentou-se um indiano que vinha com um amigo. Deu-me logo um passou-bem e apresentou-se. A partir daí não se calou mais enquanto eu não fechei os olhos e fingi que estava a dormir. Fez imensas perguntas e abusou um bocadinho da confiança, mas correu tudo bem. A comida (pequeno-almoço) já foi bastante condimentada. Era boa e eu comi-a toda, mas isso acabou por me levar 3 vezes à casa-de-banho.

Aterrámos. Estava difícil o controlo do passaporte por causa da porcaria de um papel que tínhamos que preencher. Quando cheguei à recolha da bagagem já não estava lá a minha mochila. Pânico!

“Madam”, grita um indiano [funcionário do aeroporto] a chamar por mim. Tinha a minha bagagem! Que susto.

Já na zona das “arrivals” sento-me e ponho-me a reler o meu guia da Lonely Planet. Estou com um bocado de receio de apanhar um táxi, pois é quase certo que me “roubem”. E tive razão (infelizmente). Deveria ter sido mais esperta e ter perguntado logo ao taxista quanto era. Um outro rapaz que apontava os nossos nomes e para onde íamos disse-me que era à volta de 500 rupias e que havia o taxímetro.

Guardei a mochila na bagageira, entrei no táxi e… taxímetro? Qual taxímetro? Aqui cada um faz e pede o que quer! 775 rupias foi quanto me pediu no final! Queria dar-lhe só 500, mas ele não deixou. E não me deixava ir a lado nenhum enquanto eu não lhe pagasse o que queria. Nem 700 aceitou. Perguntei-lhe se tinha o troco para os 75 e disse-lhe que não lhe dava mais 100 enquanto não me mostrasse o troco. Acabou por pedir a um homem qualquer que passava na rua os 25 e deu-mos. E pronto! Lá tive a minha primeira má experiência e o meu primeiro “roubo”.

Depois andei um pouco até ao hotel, onde já tinha reservado e pago os quase 40€ por um quarto sem janela e roupa de cama completamente suja.

22h15 – Delhi

Estive a dormir um pouco e a chorar um bocadinho mais. Isto tudo deu cabo de mim, completamente. Pode não ser perigoso vir sozinha para a Índia, mas difícil é. Muito difícil. E depois, claro, há o problema de não teres ninguém ao teu lado para ires buscar forças, mesmo que essa pessoa fosse menos desenrascada que tu. Não interessava. E já fazia toda a diferença…

Também não me armei em corajosa antes de vir para aqui. Os outros é que me viram assim. Eu apenas queria:

  • Vir à Índia para conhecer um pouco o país;

  • Saber porque é “a viagem” de muitas pessoas;

  • Fazer algo que nunca tinha feito e ver se conseguia.

E, está claro, não o consigo fazer sozinha…

Depois de chegar ao hotel fui até à recepção. Queria ir até à estação de comboios. Quando desci, estava a chover. E muito! Trovejava e tudo*. Fiquei na recepção a falar um bocado com um dos homens. Disse-lhe que ia à estação comprar bilhetes. Persuadiu-me a não ir, claro. Explicou-me que era muito confuso, que tinha muita gente. E disse que havia um sítio melhor para ter informações e comprar os bilhetes. Chamou-lhe de “information point”, mas na verdade levou-me foi a uma agência de viagens. Disse que ficava a 10 minutos de carro do hotel. Ligou a uma pessoa para me levar até lá.

Chegou o Nasir, uma espécie de guia e de “faz-tudo” para os hotéis, pareceu-me. Segui-o até a uma outra rua e a partir de lá ele procurou uma forma de nos levar. Aos dois.

Antes disso vim buscar o guarda-chuva ao meu quarto. De facto ajuda mais que uma capa, pois está muito calor e a capa seria um suplício. E tenho comigo a mochila pequena também.

O Nasir falou com vários auto-rickshaws para nos levar ao nosso destino, mas sem sucesso. Disse-me que tínhamos que ir para o outro lado da estrada para estarmos no sentido que queríamos. E foi assim que tive a minha primeira experiência numa das coisas mais impressionantes da Índia: atravessar uma estrada! É, de facto, algo… surreal! Tal como o próprio trânsito. Não dá para descrever.

As estradas (as principais, não os caminhos ou as ruas secundárias) até têm os traços no chão a indicar as faixas de rodagem, mas… Na Índia penso que só há uma regra que rege este país: não há regras! Os carros simplesmente andam como querem e onde querem. Põe-se à frente dos outros carros e os outros que se desviem. E buzinam. Buzinam muito. Buzinam mesmo muito!

As pessoas também fazem o mesmo. Não há passadeiras. Atravessas quando queres e onde queres. Dás raspões nos carros quando o trânsito está parado ou quase parado, e andas tranquilamente até ao outro lado da estrada. E é incrível como tudo funciona sem um arranhão!

Apanhámos um auto-rickshaw. O Nasir combinou com ele pagarmos 50 rupias. É uma viagem bastante interessante. Ninguém deveria sair da Índia sem andar numa coisa destas pelo menos uma vez.

E pronto! Lá chegámos nós à agência de viagens que eles queriam que eu fosse. Enfim! Eu deveria ser menos estúpida!

Quem pagou o rickshaw foi o Nasir. Eu só tinha uma nota de 100, e ele então chegou-se à frente. Deixou-me na agência e foi-se embora.

Na agência estive horas com o Raja. Primeiro estivemos a ver bilhetes de comboio. Não havia nada para o dia seguinte. Só lá para dia 12. Nem para Agra. E eu queria sair de Delhi o mais depressa possível. Vimos outros sítios, mas estava complicado fazer um roteiro de comboio que fizesse sentido. Então o Raja fez o seguinte: planeou-me um roteiro inteiro (passando por todos os lugares que eu queria ver e mais alguns) com um motorista privado. 890€ (o que dá 50€ por dia até à minha partida) e inclui os hotéis, os bilhetes de comboio para ir de Agra a Varanassi, e o motorista que me leva até onde eu quiser, quando eu quiser. O preço até está bom (comparando com os 1500€ que eu tinha visto numa agência de viagens em Portugal) e ele até tinha razão numa coisa: ok, até podia arranjar todos os bilhetes de comboio que queria, mas e depois? Como é que eu ia para os hotéis (que ainda nem sequer estão reservados) a partir das estações? Como é que eu me deslocava nas cidades que queria ver? E os comboios atrasam-se. E isso poderia trazer-me problemas. Lá está a porcaria da ingenuidade. Estou sozinha, sou mulher, e é a primeira vez que faço uma viagem destas à aventura. E logo na Índia! Como é que eu poderia achar que me safava bem apenas com o guia da Lonely Planet? Isto aqui é um mundo “selvagem”! Outras mulheres podem ter conseguido fazer uma proeza destas, mas eu claramente não sou uma delas. Não sem a ajuda necessária de quem conhece bem este país. No fundo, isto é a lei do salve-se quem puder. E eu tive que me salvar assim. E quase que chorava à frente do Ravi, pois o medo de estar a ser enganada era muito. Sozinha com um motorista o tempo todo…

Cheguei a falar com a minha mãe ao telefone. Ela disse para não fazer isto, exatamente pela mesma razão que me passava pela cabeça: o medo de que me acontecesse algo por estar sozinha num carro com um homem e num país que não conheço. Ela inclusive disse para apanhar um voo de volta para casa. Confesso que se pudesse acho que o teria feito, mas isso significava, sobretudo, que eu à mínima dificuldade tinha desistido de tudo. E não estou a falar só da viagem em si.

Bom, no final, achei que poderia confiar no Ravi. Que outra solução tinha eu?

Agora só me resta esperar que corra tudo bem… e que o meu anjo da guarda me proteja. (Entretanto, já me fartei de chorar aqui no quarto. Afinal o medo é muito. Mais do que aquilo que eu estava à espera…)

Perguntei ao Ravi onde é que eu podia comprar água e algo para comer. Falei num supermercado, mas pelos vistos é difícil arranjar um. Ele pediu ao rapaz novo que trabalha com ele para me levar a uma rua onde eu poderia escolher ir ao McDonald’s ou a um pequeno restaurante que ele indicou. Fomos a pé até a essa rua principal (acho que se chama “market street”). Decidi comer no restaurante. Havia vários tipos de cozinha e eu escolhi a “italiana” – massa com frango e molho de tomate. Cada garfada cada gole de água. Estava super picante!

45 minutos depois o rapaz voltou para me vir buscar como combinado. Andou a perguntar preços nos rickshaws. Entrámos num e passado pouco tempo saímos. O motorista estava a ir por um caminho que o rapaz não conhecia e por isso ele mandou-o parar para sairmos. Apanhámos outro. 50 rupias. O rapaz disse-me que normalmente são 30 rupias para fazer este caminho, mas quando veem que sou turista (mesmo indo com eles) pedem mais. No fim só tinha 40 rupias (e outras notas grandes) para dar. O rapaz deu os outros 10. Perguntei se eles não davam troco se déssemos dinheiro a mais e ele disse logo que não.

Já no hotel falei ao telefone com o Ravi outra vez. Ficou combinado eu sair daqui amanhã com o motorista às 9h00. Ele disse-me que vinha também (eu pedi-lhe).

E afinal como é Delhi? Delhi é o caos. É pobreza. É confusão. É chocante e de certa forma assustador. Vi as pessoas andarem à chuva sem qualquer tipo de proteção, como se não fosse nada com elas. Como se nem sequer se estivessem a encharcar todas. Vi miúdos completamente nus, à chuva, e a andarem descalços. Vi muitos miúdos descalços. Vi pessoas a correrem atrás do autocarro porque este não parou na paragem. Vi cães muito magros por aí. Vi uma “procissão” que passou nessa rua principal (dia 10 celebra-se qualquer coisa). Vi muita coisa que nunca tinha visto. E também fui vista. Muito. Até porque, estrangeiros, não vi nenhum. Nenhum! Eu era a única branca a andar por aquelas ruas todas. Mas onde é que estão os turistas?! Onde?!


Nota: A foto deste texto (onde se vê um homem com um turbante na cabeça) não foi tirada em Delhi, mas sim noutra cidade da Índia. No entanto, como eu não tirei fotos “de jeito” em Delhi (porque também não passeei por lá), decidi pôr esta que é uma das que gosto mais.

*Infelizmente eu fui à Índia na altura das monções. Não recomendo…

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Raquel Dominguez Raquel Dominguez

A minha viagem à Índia e a grande lição que aprendi com ela

Faz este Verão sete anos que fui à Índia sozinha, de mochila às costas, durante três longas semanas. Se eu soubesse o que sei hoje, nunca teria ido…

Faz este Verão sete anos que fui à Índia sozinha, de mochila às costas, durante três longas semanas. Se eu soubesse o que sei hoje, nunca teria ido…

A Índia é daqueles países que desperta curiosidade em muita gente.

Seja porque se gosta de viajar para países exóticos e de explorar culturas diferentes; porque se deseja conhecer um dos ícones mais famosos do mundo (o Taj Mahal); porque se é praticante de yoga, meditação ou fotografia “à séria”; ou porque se está ligado, de alguma forma, à espiritualidade, a verdade é que a Índia costuma vir na bucket list de muitos amantes de viagens.

Precisamente o meu caso.

Há muito tempo que eu já tinha perdido algum interesse em conhecer praias paradisíacas e cidades megalómanas. Não que elas tivessem deixado de estar na minha lista de lugares a visitar. Nada disso. A questão é que eu agora queria viajar de uma forma um pouco diferente do habitual. Com mais sentido. Não apenas para pôr mais um pin no meu mapa mundo pessoal.

E a Índia parecia-me o sítio ideal para começar.

A vontade já a tinha. A curiosidade também. Mas assim que terminei de ler o famoso livro “Comer, Orar, Amar”, a coisa tornou-se ainda mais séria…

Toda a gente sabe que viajar faz bem à alma. E a minha estava bem vazia naquela altura. A ideia de viajar sozinha para um país completamente diferente do meu parecia-me, por isso, perfeita; precisamente aquilo que eu precisava para me encontrar, bem como a felicidade e o sentido da vida que eu desesperadamente precisava encontrar.

De tanto se perder, uma hora a gente acerta o caminho – Autor desconhecido

Conhecer o mundo através das extraordinárias fotos que outras pessoas tiram faz-nos ter, muitas vezes, ideias romantizadas sobre alguns lugares. Ouvir as suas fascinantes histórias também.

E apesar de isso até despertar em nós a vontade de sair do nosso pequeno casulo (o que é bom), também nos dá, ao mesmo tempo, um grande problema:

O de criarmos expetativas irrealistas sobre o que vamos encontrar e/ou experienciar.

Precisamente o meu caso.

A verdade é que a minha vontade de viajar para a Índia fazia parte de uma das ilusões mais antigas que o ser humano carrega consigo – a de que é preciso sair de onde estamos para encontrarmos aquilo que procuramos.

Porém, as coisas não são bem assim.

Achar que precisamos de viajar até ao Tibete para sabermos o que é o verdadeiro sentido da espiritualidade, ou de ir até à Igreja para podermos estar com Deus, é das maiores falácias que a humanidade escolheu acreditar.

Mas tal como esta história nos ensina, não é preciso ir a lado nenhum para encontrarmos o que mais desejamos, pois tudo o que precisamos já se encontra dentro de nós.

A única coisa que temos de aprender, então, é saber como aceder a isso.

Até porque, tal como nos diz uma famosa frase, o único Zen que encontrarás no topo da montanha é o Zen que levas contigo.

Não, não é a quietude da montanha que te vai iluminar. São os teus próprios pensamentos. E esses tu poderás resgatá-los em qualquer lugar. Em qualquer altura. De qualquer maneira.

Com isto não estou a tirar a importância de se viajar. Até porque viajar torna-nos mais ricos. Abre-nos os horizontes. Se assim o permitirmos.

Mas para que a viagem nos possa dar o melhor que ela tem para nos dar, ela tem de ser feita sem qualquer tipo de objetivo ou expectativa. Sem nenhuma ideia pré-romantizada. Caso contrário, ela poderá sair-nos furada.

Que foi o que aconteceu comigo.

Contudo, nem tudo foi mau.

Para te dizer a verdade, a minha viagem à Índia “iluminou-me” sim. Mas não da maneira como eu pensava que ia acontecer.

Não foi lá que eu tive o meu momento de iluminação. Foi cá. No conforto da minha casa e do meu país.

Foi só quando cheguei a Portugal que percebi que não era preciso sair de onde estava para encontrar as respostas que precisava.

Mas às vezes é preciso sair de onde estamos para dar valor ao que temos. E isso eu aprendi-o bem.

O problema é que foram precisas três longas semanas a viajar num dos países mais desafiantes que eu já conheci, e a viver uma das histórias mais difíceis e marcantes que eu já vivi, para aprender essa valiosa lição.

Eu posso não ter ido aonde pretendia ir, mas acho que acabei onde precisava estar – Douglas Adams

A professora de Yoga sabia bem do que estava a falar quando me deu os seus preciosos conselhos no final da aula, depois de eu lhe ter perguntado o que ela achava sobre o facto de eu ir à Índia sozinha.

“Tens de fazer um reset à tua cabeça em relação a tudo o que já viste, conheces e acreditas. Aquilo que vais encontrar lá não é o que estás à espera, nem aquilo que alguma vez tenhas visto.”

Eu bem que tentei. Juro que tentei. Mas as malditas expetativas já se tinham apoderado de mim e eu não sabia como eliminá-las.

Ela também me disse que achava melhor eu não ir sozinha. Não porque achasse que fosse perigoso, mas porque a Índia oferecia demasiados estímulos para uma pessoa conseguir assimilar tudo sozinha.

Como ela tinha razão…

De qualquer forma, a minha decisão já estava tomada e eu não queria voltar atrás. Para além disso, eu achava que se tanta gente fazia esta viagem e até voltava para mais, então alguma coisa de bom eu iria conseguir tirar disto tudo.

Só que aquilo que eu não sabia na altura, é que são mais as pessoas (ditas) “espirituais” que foram à Índia e não gostaram do que aquilo que eu pensava.

Eu apenas fui mais uma delas…

O diário da minha viagem à Índia

Há pouco tempo li um artigo na internet que explicava porque é que algumas pessoas costumam falar alto sozinhas (sim, eu também sou uma delas…). A dada altura, o texto dizia o seguinte:

“Os sentimentos surgem dos estímulos externos, que são responsáveis por fazer o individuo aceder ao seu conteúdo emocional. Durante um dia, milhares de estímulos despertam emoções diferentes, e não há espaço suficiente para armazenar tantas coisas dentro de um único ser humano. Por isso, verbalizar é uma ótima forma de exteriorizar algumas emoções.”

Pois é. Verbalizar é, de facto, uma excelente forma que o ser humano tem de exteriorizar as suas emoções. Mas infelizmente eu não quis levar ninguém comigo para poder partilhar todas as coisas que a Índia me estava a fazer ver, ouvir, cheirar e sentir.

A minha sanidade emocional só foi salva porque eu me “colei” a todos os turistas que encontrei ao longo do caminho e, sobretudo, porque levei um caderno comigo que utilizei como diário da minha viagem – o único sítio onde eu verdadeiramente depositava tudo o que sentia. A única forma que eu arranjei para exteriorizar as minhas emoções.

É esse mesmo diário que eu tomei coragem para partilhar contigo durante as próximas semanas…

Clica aqui para o poderes ler.


Nota: A partilha do meu diário não tem como objetivo influenciar negativamente a forma como se vê a Índia. Esta é apenas a minha história. Não é a de toda a gente. Assim, nos próximos textos irei partilhar também as melhores fotografias que tirei durante a viagem; aquelas que, para mim, mostram a Índia como estamos habituados a ver: um país exótico e diferente, que desperta curiosidade e vontade de conhecer.

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A ilusão das redes sociais

Quando eu e a minha colega Margarida lançámos a nossa loja online pela primeira vez em Julho do ano passado, fomos logo contactadas por uma blogger que nos propôs fazer uma review sobre a nossa marca. Infelizmente não era aquilo que nós pensávamos…

Quando eu e a minha colega Margarida lançámos a nossa loja online pela primeira vez em Julho do ano passado, fomos logo contactadas por uma blogger que nos propôs fazer uma review sobre a nossa marca.

Ficámos em êxtase, como deves imaginar!

Uma pessoa que tem mais de 100 mil seguidores no Instagram entra em contacto connosco porque quer fazer uma publicação da nossa marca em troca, apenas, de alguns quadros nossos? Espetacular!

Mas não, afinal não foi espetacular. Nem nada que se pareça…

De facto, agora que escrevo estas palavras consigo perceber de uma forma clara que havia qualquer coisa que não fazia muito sentido nesta história.

Uma blogger contactar-nos? Ainda por cima nesta altura do campeonato quando ainda não éramos ninguém?

Alguma coisa não batia certo…

A ilusão das redes sociais

O que é mais importante? Mostrarmo-nos ao mundo como realmente somos ou como achamos que os outros nos querem ver?

Como somos, certo?

Porém, a partir do momento em que vivemos numa era que mais rapidamente premeia aqueles que se encaixam num determinado perfil em detrimento de outros, qual das situações é que achas que te trará maiores ganhos (sejam eles emocionais ou monetários), caso tu não te enquadres no estereótipo que o mundo aprecia ver? 

A segunda, não é?

Até porque se não fosse assim, algumas pessoas nunca teriam o sucesso que têm hoje graças às redes sociais.

Todos nós sabemos que as pessoas mais admiradas e apreciadas são aquelas cujos perfis melhor retratam o estilo de vida que a maior parte de nós gostaria de ter.

Seja porque estão a viajar para sítios onde nós também gostaríamos de ir, a mostrar a boa forma física que nós também gostaríamos de ter, a vivenciar a maior história de amor que nós também gostaríamos de viver, ou simplesmente a fazer algo que a maior parte de nós não pode, não consegue ou não tem oportunidade para fazer.

E porquê que isto acontece? Porque é que nós acompanhamos as histórias de quem está, aparentemente, a viver uma vida de sonho?

Porque todos nós temos algum vazio que precisamos preencher. O ser humano é simplesmente assim. Há sempre alguma coisa que nos falta, uma vez que há sempre alguma coisa que desejaríamos ter ou ser.

Ser mais bonitos, mais inteligentes, mais corajosos, mais criativos, mais confiantes, mais interessantes, mais espirituais…

Ter mais amor, mais dinheiro, mais saúde, mais sucesso, mais liberdade, mais estilo, mais atenção, mais jeito para fazer alguma coisa…

É essa a razão que nos leva a “seguir” e a “gostar” das pessoas que, para nós, representam aquilo que nós também gostaríamos de ter ou de ser.

Mas até aqui tudo bem.

Não tem mal nenhum nós acompanharmos de perto a vida daqueles que, todos os dias, nos mostram através das suas próprias vidas que é possível realizarmos os nossos sonhos.

Todos nós precisamos de ter referências na nossa vida que nos inspirem a ser uma melhor versão de nós mesmos.

Eu também as tenho.

O problema é quando sentimos necessidade de passar uma imagem que não é real, pois estamos demasiados sedentos de atenção ou porque sabemos que a recompensa por se ter um perfil com milhares de seguidores é demasiado tentadora para deixar escapar.

O que muita gente ainda não sabe sobre as redes sociais é que, em muitos casos, a realidade que está a ser mostrada não é a realidade que está a ser vivida.

E a prova disso está aqui.

Todos nascemos originais e morremos cópias - Carl Jung

Nos dias que correm, qualquer pessoa consegue ganhar notoriedade através das redes sociais, desde que consiga passar a imagem de que é ou tem aquilo que os outros também querem ser ou ter.

Há muito tempo que o mundo deixou de premiar os mais audazes.

Agora, o que importa mesmo é o número de “gostos” que temos nas nossas fotos e o número de seguidores que temos nas nossas contas de Instagram.

E porquê?

Porque o prémio que recebemos por chegar a esse patamar é grande, sobretudo a nível financeiro. Daí ser cada vez maior o número de jovens que querem ser YouTubers ou Influencers quando “forem grandes”.

Ao que parece, a vida só é boa quando se chega a esse nível.

Para além de isso gerar um certo descontentamento naqueles que têm uma vida “comum” e sem grandes sucessos, também leva a que muita gente caia na tentação de criar uma vida social que não é real só para conseguir ser “alguém” aos olhos dos outros, uma vez que o vazio que carregamos é demasiado grande para o conseguirmos suportar.

E a prova disso também está aqui.

Seja comum, seja simples, seja você quem for. Não há necessidade de ser importante, a única necessidade é de ser real. Ser real é existencial. Ser importante é viagem do ego. – Osho

Quem vive (ou quer viver) das redes sociais sabe que há truques para se conseguir o que as marcas procuram: números. Isto porque quanto maiores eles forem, maior será o retorno para a marca.

Ou pelo menos assim deveria ser.

Contudo, quando estamos a falar de um perfil que não é “real”, mas sim algo que foi “fabricado” pela própria pessoa, então só um dos lados é que fica a ganhar.

Que foi precisamente o que nos aconteceu.

Assim que uma blogger – que tem mais de 100 mil seguidores no seu Instagram e mais de 4 mil “gostos” em cada foto – publicita uma marca, é normal que os números dessa marca também disparem.

As vendas até podem não aumentar, mas se os seguidores daquela pessoa forem, de facto, pessoas “reais” que acompanham a vida daquela pessoa porque a tomam como uma inspiração, então é natural que haja repercussões positivas para as marcas que ela publicita.

Mas não foi isso o que nos aconteceu.

De todo.

Para te dizer a verdade, nem sequer um seguidor a mais tivemos na nossa página.

E porquê?

Porque era tudo falso.

Todos aqueles 4 mil “gostos” e todos aqueles 100 mil seguidores eram uma ilusão. Uma ilusão criada pela própria pessoa para conseguir os tais números que as marcas procuram (há formas de se fazer isso).

O que faz com que toda esta questão das redes sociais seja levada a um outro nível. Um nível a que eu, infelizmente, não estava preparada…

Ser importante é uma ilusão

Apesar de na altura eu ter ficado bastante chateada com o que nos aconteceu, a realidade é que a culpa não é da blogger que nos contactou.

Ela apenas também se deixou levar pelos valores que regem a sociedade nesta época em que vivemos.

Porque se ser importante é assim tão valorizado pela nossa sociedade, então o vazio não era só dela. O vazio também era meu…

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Quando a vida te dá voltas

Por vezes a vida não quer que faças o caminho que idealizaste para ti, porque ela tem outros planos para ti.

“Tens mediunidade Raquel, sabias?” - Foi assim que o Paulo dos búzios me disse recentemente qual era, afinal, o meu caminho.

Mas eu não sabia disso. E também não estava preparada para saber…

É verdade que eu sempre tive medo do escuro e que, por vezes, dormia de luz acesa.

É verdade que consigo sentir, à noite, quando não estou “sozinha” numa casa ou noutro espaço qualquer.

É verdade que já me tinham dito aqui e ali, noutras consultas que faço com este tipo de terapeutas, que sou uma pessoa extremamente “sensitiva” e que não era bem o Feng Shui aquilo que eu iria fazer.

Também é verdade que sempre tive, desde muito nova, uma atração por cartas de tarot e que de vez em quando pegava nelas, para no momento a seguir as largar, chateada com o facto de me estar sempre a sair “O Eremita”.

Mas daí até me dizerem isso e que é com a espiritualidade que eu tenho de trabalhar vai alguma distância…

“Quando estiveres no teu caminho todas as outras portas se vão abrir”

Foi isto o que o Paulo também me disse na primeira consulta que fiz com ele há quase dez anos atrás. A diferença é que, naquela altura, eu ainda estava longe de saber qual era, afinal, o “meu caminho”.

Trabalhar com pessoas era algo que nem sequer me passava pela cabeça, quanto mais fazê-lo através da espiritualidade. A verdade é que sempre fui, e continuo a ser, uma pessoa extremamente racional, o que me levou sempre a acreditar que de “intuitiva” não tinha nada.

Mas quando a vida tem planos para ti, não há nada que possas fazer para fugir deles. Mais cedo ou mais tarde eles acabarão por vir ter contigo, quer estejas preparada quer não.

Foi o que me aconteceu quando decidi tirar o curso de Feng Shui.

Vai e confia

Como boa “racional” que sou, assim que comecei a aprender Feng Shui abracei logo a parte mais “mental” do mesmo (o Feng Shui Clássico), deixando para segundo plano toda e qualquer forma de Feng Shui Intuitivo.

Apesar do fascínio que até tinha por este método – e por todas as pessoas extremamente intuitivas e até mediúnicas que fui conhecendo ao longo do curso –, eu continuava a achar que as minhas capacidades nesse campo eram bastante limitadas (principalmente quando me comparava com essas mesmas pessoas).

Até que um dia fui posta à prova.

Lembro-me perfeitamente como se fosse hoje. Estava no carro com a minha colega Mónica a caminho da Feira Zen na Ericeira, pedindo-lhe fervorosamente que fizéssemos todas as consultas de Feng Shui Simbólico em conjunto, pois eu não conseguia ver absolutamente nada nas plantas que as pessoas desenhavam.

Nessa feira nós estávamos ao serviço da Escola Nacional de Feng Shui, a dar consultas por donativo a quem estivesse interessado. Nessas “mini-consultas” as pessoas desenhavam a planta da sua casa e de seguida nós líamos o seu desenho, tentando perceber o que é que o seu inconsciente nos estava a tentar dizer.

Para quem gostava de praticar Feng Shui usando uma bússola cheia de caracteres chineses como eu, olhar para um desenho e tirar informações dali era algo que estava completamente fora da minha zona de conforto.

Mas enquanto eu fui fazendo isso com a ajuda da Mónica a coisa lá foi andando. O problema foi quando me vi obrigada a fazê-lo sozinha porque a Mónica já estava ocupada a atender outra pessoa.

Fiquei em pânico, como deves imaginar!

Então e agora como é que eu ia fazer isto? E se eu não conseguisse ver nada? E se eu estivesse a ver tudo errado? Estava tramada!

Pensava eu.

Assim que começas nunca mais voltas atrás

O difícil é começar. É como se costuma dizer. E é bem verdade.

Não há nada como seres atirada aos leões para perceberes que até és capaz de correr. E bem!

Quando as coisas estão lá, estão lá. Não há hipótese. Elas acabarão por vir ao de cima quando menos esperares e quanto menos tempo tiveres para pensar nelas.

Foi precisamente o que me aconteceu.

De repente, comecei a dizer coisas. E quanto mais coisas dizia, mais informação me vinha. E quanto mais informação me vinha, mais sentido tudo me fazia.

Estava dado o clique e já não havia mais forma de voltar atrás. Agora só me restava continuar.

Foi o que eu fiz.

O segredo está no equilíbrio

À medida que ia fazendo mais consultas de Feng Shui – agora com o Feng Shui Intuitivo incluído – ia tendo, também, uma melhor noção daquilo que eu era capaz de fazer e, principalmente, daquilo que eu realmente gostava mais de fazer: trabalhar com pessoas, utilizando a minha intuição.

Incrível, não é?

Como é que uma pessoa que se achava tão racional começa a trabalhar de forma tão intuitiva?

Eu digo-te.

Porque uma coisa não tem nada a ver com a outra.

Ser racional não é incompatível com ser-se intuitivo. Ser racional é apenas a outra face da mesma moeda. E é por isso que tu não precisas de escolher qual delas é que queres “ser”.

Todos nós somos seres racionais e intuitivos. Não somos seres racionais ou intuitivos. E para mim o equilíbrio está precisamente aqui. Em saber usar os dois no momento certo e não em escolher um, desdenhando o outro. Até porque um não é melhor do que o outro. Um é apenas o oposto e o complemento do outro.

E ponto final.

Os sinais estão sempre lá. Nós é que fazemos de conta que não os estamos a ver.

Lembro-me bem de um dia estar no Porto a dar consultas de Feng Shui Intuitivo em conjunto com uma amiga numeróloga e de repente virar-me para a pessoa que tinha à minha frente e perguntar-lhe:

 - Tu és médium, não és?

- Sou, respondeu-me ela.

- Como é que sabes isso? – perguntou-me a minha amiga – Estás a ver na planta?

Não, não estava a ver na planta. E também não sei como é que o sabia. Eu só sei que o sabia.

As evidências começavam a estar lá. E eu apercebia-me disso. Eu apenas lhe dava outro nome. Chamava-lhe “intuição”.

Achava que era normal o que conseguia fazer e que qualquer pessoa era capaz de o fazer (e ainda acho). Afinal de contas, eu não vejo espíritos e nem falo com espíritos. Eu apenas sei algumas coisas quando estou em consulta com as pessoas.

A informação é te dada de uma forma tão normal e natural que até parece que és tu que a estás a ter.

Mas não é.

Quantas vezes precisas de bater com a cabeça nas paredes?

A vida tem, de facto, uma capacidade incrível de te empurrar para aquilo que é suposto fazeres, se estiveres disposta a ver “os sinais”. O problema é que ela costuma fazê-lo de uma forma muito pouco simpática.

Puxa-te aqui um tapete. Puxa-te ali outro. Não deixa que certas coisas na tua vida se desenrolem da maneira como gostarias. Enfim, é preciso bater com a cabeça nas paredes muitas vezes – e cada vez com mais força – para perceberes, de uma vez por todas, aquilo que ela te está a tentar dizer.

E, ao que parecia, chamar Feng Shui àquilo que eu fazia não era bem o que eu estava a fazer, nem “o caminho” que era suposto seguir.

Se nunca tentares, nunca saberás.

Ter respostas é muito bom. É aliviante. É libertador.

Dizerem-te o porquê de as coisas estarem como estão e o que deves fazer para as mudar é deveras tranquilizante.

Contudo, por mais que estes terapeutas te queiram ajudar, há sempre uma coisa que a maior parte deles não te consegue dizer:

Como é que vais fazer esse caminho. Porque isso és tu que tens de descobrir.

Confesso que fiquei perdida durante algum tempo. Mas eu sabia que ninguém me podia ajudar. Só eu é que sei quem sou, como sou, o que gosto de fazer e como gosto de o fazer. A partir daí é uma questão de tentar. De experimentar. Não há fórmulas certas. Cada um encontra a sua.

E é assim que é suposto ser.

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Porque é tão difícil realizarmos os nossos sonhos?

Espero que tenhas coragem para ler o texto até ao fim…

Quando publiquei o texto A minha vida não é o que parece na minha página de Facebook, não estava à espera da quantidade de comentários que obtive. Sobretudo os que vieram por mensagem privada.

Houve quem tivesse ressoado com aquilo que escrevi.

Houve quem me tivesse dado força e apoio.

E houve quem me tivesse dito estas palavras:

Olá. Vi o artigo que escreveste sobre A minha vida não é o que parece. E revejo-me muito… E como eu, muitas pessoas como viste… E muitas mais que não se manifestaram… Eu quando li tive a clara sensação que este pode ser mais um caminho para ti e que talvez ainda não estejas a ver. Quem sabe… Estou a partilhar o que senti… Porque não falas tu em vídeo ou live? Sobre esse processo, esse sentir que as coisas não correm como esperavas e dás a volta. Como consegues reencontrar-te. Regressar ao centro, ao foco. É difícil, eu sei, mas se consegues partilha-o. É uma ideia e pode ser uma nova porta para ti, porque sinto que és sensível ao ponto de o poderes revelar de forma a quem precisa de ti.

Dou-te o meu exemplo… Tu falaste que abriste vários workshops e não tiveste número suficiente para avançar. Eu nem nunca tive coragem para o fazer com medo de lidar com essa falta de adesão… (…) E quando te li pensei “tu tens tudo isso… Nem que seja essa história para contar… Essas tentativas e erro. Cair e levantar… Viveste!! ” Não sei como fazes para te reergueres, mas gostava de saber… Aguardo a tua partilha se sentires… Eu e muitas mais pessoas…

“Como consegues motivar-te para que toda essa mudança passe do interior para o exterior?” – Ana Oliveira

Confesso que quando li esta mensagem fiquei meio atrapalhada e sem saber o que fazer.

Para mim, o que esta pessoa me estava a pedir era, pura e simplesmente, algo muito parecido ao que eu sempre imaginei que um dia viria a fazer:

Partilhar a minha história de como consegui realizar os meus sonhos.

O problema é que eu ainda não os consegui realizar. O que faz com que eu ache que não tenha assim muito para dizer…

E isso assustou-me.

Porém, o desafio estava lançado e eu decidi aceitá-lo.

Como não sabia por onde começar, decidi gravar um pequeno vídeo onde pedi às pessoas que me dissessem o que gostariam que eu partilhasse sobre a minha história.

Os comentários, contudo, foram poucos.

As perguntas também.

Uma delas foi a que escrevi em cima (como sub-título desta parte do texto), publicada pela Ana.

A outra, em mensagem privada, foi assim:

Adorei o teu vídeo. E subescrevo as palavras da Pessoa X sobre Comentário Y (que foi feito no post do vídeo). Fazer o coaching contigo fez todo o sentido. (…) Mas ainda não consigo acreditar e nem confiar na minha potencialidade para criar algo meu. Não estou a ser uma boa coach… Com os outros é sempre mais fácil… Por isso te pergunto. Que exercícios fazes para não desistir? E não teres medo de lançar um projeto? O meu medo é sempre o mesmo. Serei sempre mais uma e não faz sentido e desisto…

Demorei muito tempo até me predispor a responder a estas duas perguntas.

Primeiro, porque achava que não tinha muito para dizer…

E segundo, porque não sabia o que dizer…

Mas aos poucos, lá fui respondendo através de algumas postagens que ia fazendo no meu blog e na minha página de Facebook. Às vezes de uma forma mais direta, outras vezes menos. No entanto, no fundo da minha cabeça, havia sempre uma vozinha que me continuava a dizer: Tens de lhes responder.

Até que chegou a hora.

E a minha resposta começa assim:

I can. I will. End of story.*

Imagina que tens um filho doente. Muito doente.

Vais a um médico. Ele vê o teu filho, receita-te alguns medicamentos e manda-te para casa.

Fazes tudo o que ele te diz, mas percebes que o teu filho não melhora.

Vais a outro médico, mas o mesmo acontece.

Vais a outro. E novamente o mesmo.

Aos poucos, começas a perceber que ninguém sabe o que o teu filho tem.

Vais a mais médicos, mas a história é sempre a mesma.

Começas a ficar extremamente preocupada e assustada. Vês o tempo passar, o teu filho a piorar e ninguém te consegue ajudar.

Desistes de procurar ajuda?

Claro que não! Nem te passa tal coisa pela cabeça! Pelo teu filho vais até ao fim do mundo se for preciso!

Continuas a tua procura por um médico que te possa ajudar.

Falas com toda a gente que conheces.

Passas horas a fio a fazer pesquisas na internet.

Tentas tudo e mais alguma coisa. Medicinas alternativas, curandeiros, mezinhas caseiras, rezas – tudo o que for preciso para que o teu filho se cure.

Até que finalmente descobres que ele tem uma doença rara e que o único médico que te pode ajudar vive nos Estados Unidos.

O tratamento é caro. Muito caro mesmo. Já para não falar de todas as despesas associadas à deslocação e estadia que terás de suportar.

É agora que desistes?

Nunca na vida! Já disseste uma vez e voltas a repeti-lo: pelo teu filho vais até ao fim do mundo!

Pedes ajuda à tua família. Dão-te aquilo que podem, mas ainda não é o suficiente.

Vais ao banco e pedes um empréstimo.

É-te negado.

Decides fazer uma angariação de fundos, pedindo donativos a todas as pessoas que conheces e não conheces.

Consegues juntar mais algum, mas ainda não dá para tudo.

Até que resolves vender a tua casa.

Coloca-la à venda, mas rapidamente percebes que o processo demora mais tempo do que aquele que tens para dar.

Baixas o preço.

Baixas mais um bocadinho.

E ainda mais um bocadinho.

A casa é finalmente vendida.

Agora sim, já tens o dinheiro todo que precisas. Dá para pagar o tratamento, as despesas extra e ainda aguentares-te por lá durante algum tempo.

Depois disto tudo, só fica a faltar mais uma coisa: pedires uma licença sem vencimento no teu trabalho.

Para tua grande desilusão, não ta dão!

E agora? O que é que fazes?

Sabes que vais gastar o teu dinheiro todo quando estiveres nos EUA e que, quando voltares, vens com uma mão à frente e outra atrás. O teu trabaho era a segurança que precisavas para começar de novo quando chegasses a Portugal.

Vais finalmente desistir?

Nem pensar! Depois de tudo o que já fizeste até agora?! Que se f*** o trabalho! O teu filho é mais importante do que tudo!

Despedes-te, fazes as tuas malas e mudas-te para os Estados Unidos.

Quando lá chegas, apercebes-te de que as coisas vão ser mais difíceis do que aquilo que imaginavas. O tratamento é longo e requer muito de ti e do teu filho.

Começas a quebrar. Podes ser forte, mas não consegues aguentar tudo. Como estás sozinha num país estrangeiro, decides procurar apoio noutros pais que estejam a passar pela mesma situação do que tu.

À medida que o tempo vai passando, o teu filho vai melhorando. Finalmente vês uma luz ao fundo do túnel, mas sabes que ainda tens muito para caminhar.

O dinheiro vai-se gastando e já não há mais onde o ir buscar. Decides procurar um emprego, mas o teu inglês só te consegue arranjar um trabalho como camareira num hotel. Aceitas.

Com o tempo, a exaustão começa a tomar conta de ti. Tanto física como emocionalmente. Desistir não é uma opção para ti, mas perguntas-te quanto tempo mais conseguirás aguentar.

O tempo vai passando…

Passando…

Passando…

Até que chega o tão esperado dia!

O teu filho está curado e os dois vão finalmente para casa.

Pessoas com metas triunfam porque sabem para onde vão. É tão simples quanto isso – Earl Nightingale

Respondendo agora às questões que me foram colocadas:

Penso que uma das razões que te leva a não desistir de ir atrás de algo - por muito medo que dê e por muito difícil que seja - tem a ver com o quanto tu desejas alcançar isso mesmo. E quando falo em quantidade, falo mesmo em algo que te consome por dentro. Que não te deixa dormir. Que te faz falar e pensar nisso 24h por dia.

Quando queres muito uma coisa (mas mesmo muito!), tu vais atrás. Tu fazes tudo o que estiver ao teu alcance para conseguires chegar até onde desejas estar.

O desejo que te move é tão grande, que só “paras” no dia em que te aperceberes que já chegaste onde querias.

Quando acreditas muito (mas mesmo muito!) no objetivo que queres atingir, tu irás automaticamente dar todos os passos necessários para o conseguires realizar. É assim que vais sentindo, aos poucos, confiança em ti própria. É assim que começas a acreditar em ti.

A motivação aparece com o tempo. Não é preciso ir buscá-la a lado nenhum. Ela vem do forte desejo em quereres alcançar muito o teu objetivo final.   

A força para o realizares também.

Não há nada que tu precises ir buscar ao exterior que já não esteja dentro de ti.

Determinação, persistência, paciência, resiliência – tudo isso virá ao de cima a partir do momento em que decidas que queres muito uma coisa.

É esse o segredo que fará com que tu nunca desistas.

Mesmo quando a vontade às vezes não está lá.

Mesmo quando o teu corpo já não aguenta mais.

Mesmo quando percebes que emocionalmente estás um farrapo.

Mesmo quanto toda a gente à tua volta dúvida de ti.

Mesmo quando estás com medo p’ra caraças.

Mesmo quando as coisas não acontecem como tu querias.

Mesmo quando as coisas falham vezes e vezes sem conta.

Mesmo quando parece que nunca mais chegas lá.

Mas é esse o segredo. Não há exercícios para não desistir. Quando queres muito uma coisa, tu vais atrás até conseguires!

Tal e qual como farias se fosses aquela mãe…

Se é importante para ti, arranjas uma forma. Se não é, arranjas uma desculpa – Ryan Blair

Qual é, então, a diferença entre as duas situações? Porque é que quando se trata do nosso filho nós fazemos tudo o que for preciso para alcançar o objetivo final e quando o assunto é connosco não conseguimos fazer isso?

Uma das razões, lamento dizer, tem a ver com o nosso amor próprio…

O que quero eu dizer com isto?

Que a felicidade do teu filho é mais importante do que a tua.

Que quando se trata do bem-estar deletu queres muito uma coisa. Quando é o teu, já não (isto já para não falar dos sentimentos de culpa que daí advêm; connosco eles não existem, pelo menos não a uma escala que nos incomode ou que nos faça fazer algo em relação a isso).

O que mostra que o “problema” não está na tua falta de fé, dinheiro, apoio, tempo ou outras questões. E muito menos está na falta de capacidades tuas em conseguires realizar o que queres alcançar.

O “problema” está, em parte, na tua falta de amor próprio. Porque, tal como já percebeste, por amor tu fazes tudo. E pelo teu filho tu tem-lo todo.

Por outro lado, o “problema” também pode estar no facto de ainda não teres achado algo que tu queiras muito. Mas mesmo muito!

Tanto que tu serias capaz de ir até ao fim do mundo para o alcançares.

Neste momento, aquilo que tu na realidade tens talvez sejam só desejos. Desejos esses que te fazem dizer: “eu gostava muito de ter isto” ou “eu gostava muito de fazer aquilo”.

Mas até que esses desejos se tornem fortes o suficiente para ti, tu nunca irás correr atrás deles.

Porquê?

Porque a situação “desconfortável” em que te encontras não é, afinal, tão desconfortável assim. Pelo menos não o suficiente que te leve a tomar uma atitude de a querer mudar.

O que me leva à terceira razão pela qual nós muitas vezes não conseguimos ir atrás dos nossos sonhos: o conformismo.

Repara, tu até podes querer muito uma coisa, mas como tens medo de que, ao ir atrás, as coisas possam correr mal e acabes por ficar pior do que já estavas, então decides não correr o risco.

Afinal de contas, mais vale ter pouco do que nada!

Porque o problema do conformismo é esse mesmo:

Ele mói, mas não mata…


*Decidi manter esta frase em inglês porque acho que tem mais impacto, mas se tivesse que a traduzir para português escreveria algo como: Eu consigo fazer. Eu vou fazer. E ponto final.

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Como lidar com o medo de falhar?

Será que a dor de viver uma vida sem sentido é mais fácil de suportar do que aquela que vem de uma vez só?

O dicionário online da Priberam diz que falhar significa, entre outras coisas, não produzir o efeito desejado.

Mas… e se esse efeito desejado não for a melhor coisa que nos podia acontecer? E se aquilo que estiver reservado para nós for maior do que aquilo que nós conseguimos imaginar?

Será que isso faz do ato de falhar algo assim tão mau?

Quando tomamos o ato de falhar como sinónimo de algo que queríamos muito e não conseguimos, falhar torna-se, de facto, uma situação bastante dolorosa pela qual evitamos a todo o custo passar.

Afinal de contas, ninguém gosta de ser contrariado. Desde pequenos que somos assim. 

Sonhar faz parte do ser humano. Concretizar objetivos também. O sentimento de realização pessoal que daí advém é impagável. E todos nós queremos senti-lo.

Vezes e vezes sem conta…

Às vezes não conseguir o que se quer é uma tremenda sorte - Dalai Lama

Quando no início de 2017 abri um espaço com uma amiga, eu trazia na cabeça todo um cenário de expectativas de que as coisas iriam correr bem. Ninguém investe dinheiro a meter-se numa coisa que à partida acha que não vai dar certo. NinguémPodemos até ter medo, mas pensar que não vai funcionar é que não.

No entanto, não foi isso o que acabou por acontecer. O efeito desejado não se deu, para minha grande surpresa e das minhas expectativas. Tudo estava a falhar e eu não queria acreditar.  

Os joelhos foram ao chão. A cara também. E, infelizmente, outras coisas mais…

Eu falhei, e não havia nada que eu pudesse fazer senão começar de novo, ao mesmo tempo que tentava limpar todos os estragos que tinha feito ao longo do caminho.

Quem é que quer passar por uma coisa assim?

Nenhum de nós quer. É por isso que tanta gente não arrisca fazer aquilo que sente que é melhor para si. Porque tem medo que algo falhe pelo caminho.

Mas vai falhar.

E sabes quantas vezes?

As que forem precisas para te levar até onde é suposto estares.

E ainda bem que assim o é.

Por muito que me tenha custado, foi preciso eu ter batido com a cara no chão para finalmente aceitar aquilo que já tinha percebido uns meses antes, mas com o qual eu não queria lidar.

No fundo, no fundo, eu sabia que o Feng Shui já não era (apenas) aquilo que eu queria fazer para o resto da minha vida. E, por isso, abrir um espaço para dar formações de Feng Shui não fazia qualquer sentido.

Era um erro do qual o meu inconsciente já tinha perfeita noção, mas a minha mente consciente não. Essa andava ocupada a trabalhar noite e dia, a tentar perceber como é que eu iria ter os meus workshops cheios de gente. Pois era isso o que eu queria ter. Era esse o efeito desejado.

E ainda é. Apenas não com o Feng Shui…

Com o tempo apercebi-me de que aquele falhanço foi, na verdade, um grande alívio para mim. Sem me dar conta, eu estava a fazer algo que não acreditava totalmente. É claro que o desfecho só podia ter sido esse.

Caso tivesse sido outro, o mais provável era eu não estar aqui a escrever este texto agora. Algo que se aproxima muito mais daquilo que eu sempre disse (para mim, em segredo) que um dia queria fazer com a minha vida:

Inspirar pessoas.

Se já o faço ou não, não sei. Algumas pessoas dizem-me que sim, apesar da minha mente super exigente e perfecionista dizer que não.

Se vou conseguir fazê-lo numa escala maior ou não, também não sei. Mas acredito que sim, mesmo não sabendo quando e como.

Se vou falhar mais vezes durante o caminho, ah, isso é quase garantido que sim. O que não me deixa outra hipótese senão ajustar a forma como eu escolho lidar com o ato de falhar.

Parar é que não!

Crescer é doloroso. Mudar é doloroso. Mas nada é mais doloroso do que ficar preso num lugar onde não se pertence - Autor desconhecido

Falhar faz parte do processo de aprendizagem. E por isso não temos como fugir dele.

Mas o nosso mecanismo de defesa interno é esperto e tenta, pelo menos, controlar a dimensão com que ele nos atinge. Mesmo que isso signifique ficar preso a uma vida, trabalho, relação ou qualquer outra coisa que já não faça mais sentido para nós.

Só que, para mim, isso é como morrer aos bocadinhos…

Eu sei que não somos todos iguais e que não queremos todos chegar ao mesmo sítio. E nem é suposto ser assim.

Porém, tenho a certeza que muitos de nós tem à sua espera uma vida bem mais feliz para viver do que aquela que vive agora, desde que estejamos dispostos a tentar descobrir o lugar onde pertencemos.

Custe isso os falhanços que custar…

*** 

Não queria terminar este texto sem antes partilhar contigo este vídeo (a partir do minuto 7:48) de um discurso que a JK Rowling – autora dos famosos livros do Harry Potter – fez para os finalistas de uma universidade. Uma vez que ele está em inglês, bem como as suas legendas, eu decidi traduzir livremente uma parte do seu discurso, pois não queria que perdesses um único significado das suas palavras.

Espero que te inspire :)

Eu falhei de forma épica. Um casamento excecionalmente curto tinha acabado; eu estava desempregada; era mãe solteira e estava tão pobre quanto é possível estar numa Inglaterra moderna sem se ser um sem abrigo. Os medos que os meus pais tinham por mim - e que eu também tinha - tornaram-se realidade. E de acordo com todos os padrões da altura, eu era o maior fracasso que conhecia. Esse período da minha vida foi sombrio. Eu não fazia ideia na altura do quão fundo era o túnel. E, por muito tempo, qualquer luz que eu visse no final do mesmo era mais uma esperança do que uma realidade.

Mas porque vos quero falar sobre os benefícios do fracasso? Simplesmente porque o fracasso significou para mim eliminar o que não era essencial. Eu parei de fingir a mim mesma que era outra coisa senão aquilo que era, e comecei a direcionar toda a minha energia em terminar o único trabalho que importava para mim.

Se eu tivesse sido bem-sucedida em qualquer outra coisa, talvez nunca tivesse descoberto a determinação para ter sucesso na única área em que eu realmente acreditava pertencer. Eu fui libertada porque o meu maior medo tinha sido reconhecido e eu ainda estava viva. Ainda tinha uma filha que adorava, uma velha máquina de escrever e uma grande ideia. E assim o fundo do poço tornou-se a base sólida sobre o qual eu reconstruí a minha vida.

Vocês até podem nunca vir a falhar na mesma escala que eu, mas passar por algum tipo de fracasso na vida é inevitável. É impossível viver sem falhar em alguma coisa, a não ser que tu vivas com tanto cuidado que também acabarás por não viver de todo – o que fará com que falhes por defeito. O fracasso ensinou-me coisas sobre mim mesma que eu nunca poderia ter aprendido de outra maneira. Eu descobri que tinha uma grande força de vontade e mais disciplina do que aquilo que pensava. E também descobri que tinha amigos cujo valor estava muito acima do preço de qualquer rubi.

Saber que conseguiste erguer-te mais forte e mais sábia das adversidades significa que poderás estar sempre segura na tua capacidade de sobrevivência. Tu nunca te conhecerás verdadeiramente, nem saberás quão forte são os teus relacionamentos, até que ambos tenham sido testados pela adversidade.

Esse conhecimento é uma verdadeira dádiva, apesar de ser dolorosa, e valeu mais do que qualquer qualificação que eu já tenha obtido. Assim, se eu viajasse no tempo, eu diria ao meu eu de 21 anos que a felicidade pessoal reside em saber que a vida não é uma lista de aquisições ou conquistas. A vida é complicada e está além do controlo total de qualquer pessoa. E a humildade de saber isso irá permitir-te sobreviver às suas vicissitudes.

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A arte de saber manter a calma

Conta a história que na China antiga vivia um homem que dedicara toda a sua vida a procurar sabedoria através das artes marciais.

Conta a história que na China antiga vivia um homem que dedicara toda a sua vida a procurar sabedoria através das artes marciais.

Para ele, as artes marciais representavam uma forma de crescer na arte do autocontrolo. A sua dedicação e perícia espalhavam a sua reputação por toda a região, o que fazia com estivesse sempre rodeado de discípulos.

O mais novo de todos eles chamava-se Morihei. Era um menino de baixa estatura e bom coração que já treinava há muitos anos, mas a quem o mestre recusava dar o cinturão que lhe certificava a aprendizagem.

 Quando demonstrares que já aprendeste a estar centrado no meio das dificuldades – disse ele –, o cinturão será teu.

Morihei queixava-se em silêncio, mas ele sabia as razões do ancião. Já há algum tempo que, devido à sua pequena estatura, os miúdos da vila gozavam com ele quando o viam a descer a rua. E embora repetisse várias vezes para si que não precisava de perder a calma, não passava uma semana sem que acabasse por andar à luta.

Quando alguém gozava com ele, ele reagia e esquecia tudo, apesar de saber que, ao fazê-lo, atrasava o seu tão desejado cinturão.

Um dia ele decidiu ir ter com o seu mestre e contou-lhe, entre lágrimas, o quanto ele se esforçava por manter a calma, mas que no final acabava sempre por perder o controlo. Enquanto o mestre o ouvia em silêncio, Morihei decidiu perguntar-lhe algo que nunca antes ousara perguntar:

– Mestre, como é que você faz para nunca perder a calma?

– E quem te disse a ti que eu nunca a perco? – respondeu o mestre, para grande surpresa de Morihei.

– Você? – gaguejou.

– E várias vezes por dia. – acrescentou o ancião.

Morihei não podia acreditar no que estava a ouvir. Se o seu mestre, que dedicara toda a sua vida a praticar o autodomínio, perdia a calma, então que esperanças podia ter ele? Mas o ancião, ao adivinhar a sua frustração, disse-lhe:

– Morihei, todos estes anos de disciplina não fizeram com que eu não saísse do meu centro, mas permitiram-me, sim, que eu voltasse cada vez mais rápido a ele. Antes – continuou ele –, uma ofensa poderia viver meses e até anos dentro de mim. Hoje essa mesma ofensa só poderá desviar-me do meu caminho por alguns segundos. A pergunta – acrescentou – não é: “Como faço para não perder a calma?” Mas sim: “Como faço para recuperá-la cada vez mais rápido?”

O que atrapalha mais a nossa vida é a imagem que fazemos na nossa cabeça de como as coisas deveriam ser - Sócrates

Quando li pela primeira vez esta história fiquei completamente rendida à lição que ela encerra. Enquanto a minha cara expressava um absoluto pasmo, o meu corpo experienciava um total sentimento de alívio.

Como é que uma lição tão simples podia ser tão óbvia?

Como é que uma ligeira mudança numa pergunta podia fazer tanta diferença na forma como eu passava a ver as coisas?

Mais: Como é que uma pequena história como esta podia ter tanto impacto na forma como eu me passei a sentir cada vez que me chateio com alguma coisa?

Afinal de contas, é normal eu chatear-me. É normal eu ficar frustrada com algumas pessoas ou situações. É normal eu perder a calma.

Faz parte de se ser humano. Faz parte da vida.

O que não é normal é eu ficar agarrada ao sentimento que daí advém. O que não é bom é a forma descontrolada e desproporcional com que eu manifesto essa frustração.

As emoções são para serem sentidas, não para serem entupidas.

É por isso que existe um rol de emoções à nossa disposição, pronto para nos ajudar a expressar aquilo que estamos a sentir no momento. Seja isso agradável ou não.

Entupi-las dentro de nós, só nos vai fazer mal.

Expressá-las agressivamente, só vai fazer mal ao outro.

O que esta história maravilhosamente nos ensina é que, ao contrário daquilo que pensamos, estar em paz não significa que deixamos de sentir certas coisas como elas são. Estar em paz significa, sim, que passamos a lidar com elas de outra maneira.

E a história continua…

– Nunca tinha visto as coisas assim… – reconheceu Morihei.

– Agora, para poderes voltar ao teu centro cada vez mais rápido, precisarás de te apoderar das tuas pausas. – disse o mestre – Quando sentires vontade de reagir, faz uma pausa. Encontra qualquer desculpa para parar e respirar, permitindo que as tuas emoções mudem e as tuas ideias sejam organizadas de acordo com as tuas prioridades.

– Percebo… – disse Morihei -, mas é nesses momentos que mais me falta a força para me controlar.

– A força para escolher a pausa em vez da reação – continuou o mestre – vem do coração. Mas o teu autocontrolo irá enfraquecer ou aumentar, dependendo de quantas vezes por dia tu conseguires disfrutar das satisfações que terás sempre que te mantiveres no teu caminho.

Morihei levou muito a sério os ensinamentos do seu mestre, e não só conseguiu parar de lutar na rua, como também se tornou um exemplo ao evitar discussões e impedir, inclusivamente, que outros brigassem.

Numa tarde, o mestre chamou-o e disse-lhe:

– Morihei, há mais de um ano que tu não me perguntas sobre o teu cinturão. Por acaso perdeste o interesse nas artes marciais?

– Não, mestre. As artes marciais tornaram-se a minha vida, mas não procuro mais cinturões. Agora procuro ser o que o cinturão representa.

O mestre sorriu e disse:

– Agora que não precisas mais deles, estás preparado para receber todos os cinturões.


Nota: O nome completo deste discípulo é Morihei Ueshiba, o criador do Aikido ou da Arte da Paz como ele o chamava.

Esta história foi retirada e traduzida livremente do livro Cómo Hacer que las Cosas Pasen, de Guillermo Echevarría

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Cada um sente a dor como quer

E eu tenho a forma de sentir a minha.

Sábado, dia 04, à noite, cheguei à terra dos meus avós com a minha tia para passar cá uns dias.

Domingo de manhã o meu avô cai, bate com a cabeça no cimento da entrada da casa e faz um traumatismo craniano. Vai para o hospital e fica lá.

Sábado, dia 11, à noite, a minha avó tem um AVC e vai para o hospital.

No domingo de manhã o hospital liga-nos a dizer que o meu avô faleceu.

A minha avó, por estar hospitalizada, não sabe de nada. E nós temos receio de lhe dizer...

Segunda, dia 13, à tarde, dá-se o velório. O meu primo entretanto chega de Lisboa. E eu vou a Viseu dar a notícia à minha avó.

Ela suplica à médica que a deixem sair para ir ao funeral, mas fica mais uma noite no hospital para ser acompanhada. Se ficar estável, dão-lhe alta.

Terça de manhã vamos buscá-la. Às 9h30 dá-se a missa e depois o funeral. Enquanto isso acontece eu vou a Moimenta da Beira aviar a receita médica dela.

Cada um sente a dor à sua maneira

Não entrei uma única vez na capela onde estava o caixão aberto, nem me atrevi a olhar lá para dentro. E também não fui ao funeral.

Não quis.

Quando chegou a altura do velório, e antes de eu ir ter com a minha avó, a minha mãe virou-se para mim e perguntou-me:

- Não vais à capela ver o teu avô?

- Não.

- Mas é a última morada dele.

- Não é não mãe. A última morada dele é aqui, na minha cabeça e no meu coração.

É onde guardo a última imagem dele. Ainda vivo. No hospital, é certo. Mas com boa cara. Essa é a última imagem que quero recordar dele, juntamente com todas as outras que se formaram lá atrás.

São imagens da minha cabeça que estão diretamente ligadas ao meu coração. É lá que ficam guardadas, juntamente com o adeus que lhe disse quando estava sozinha sentada na varanda da casa dos meus avós enquanto decorria o funeral.

O sentir não tem regras

Quando o meu primo – dois anos mais novo que eu – soube que eu não ia ao velório nem ao funeral, a sua cara disse-me tudo. Eu bem sei que ele também não gosta destas coisas…

Mas foi.

Disse que ia por respeito.

Eu pergunto: Respeito a quem? A ele não era certamente, porque ele não tinha vontade nenhuma de ir ver o avô no caixão.

Seria então respeito ao nosso avô? À minha tia (mãe dele)? Ou às “regras sociais”? Aquelas que nos dizem o que devemos fazer em determinadas situações. Para que ninguém pense outra coisa de nós. Nem nós mesmos, por não estarmos a fazer o que é suposto fazer.

Mal chegou a casa – passados nem 10 minutos – disse-me logo:

- Ainda bem que tu não vais lá! Eu nem consegui lá ficar muito tempo! O avô está com um aspeto horrível! Da última vez que o vi (há pouco mais de um mês) ele não estava assim. Está magro.

Mas não estava. Disse-me a minha tia que estava igual. Só que o meu primo não respeitou aquilo que (verdadeiramente) sentia e será essa agora a última imagem que guardará dentro de si.

Fazemo-lo por nós ou pelos outros?

Quando vinha no carro com a minha avó, depois de a termos ido buscar ao hospital, avisei-a que não ia ao funeral. Ficou desgostosa. E não compreendeu porquê.

Na cabeça dela não fazia sentido. Na religião dela também não. Afinal de contas, como é que eu não ia ver o avô?

Expliquei-lhe que eu não sentia as coisas da mesma maneira. Que não gostava destes rituais. E que me sentia melhor assim.

Depois do funeral fui com a minha tia ao cemitério. Ela mostrou-me a campa do meu avô e todas as coroas de flores que ele recebeu. Reparou que algumas já estavam a murchar.

Enquanto saíamos de lá ela contava-me como eram caras as coroas de flores e que para ela não fazia sentido nenhum gastar tanto dinheiro em tantas flores que no final acabavam por não durar nada.

Perguntei-lhe o que é que ela faria com esse dinheiro então. Disse-me que daria aos pobres.

Também lhe perguntei porque é que acabaram por mandar fazer duas coroas (em nome dela e do meu primo, e em nome da minha mãe e meu), em vez de se fazer só uma para todos como se chegou a falar inicialmente. Disse-me que foi porque a tia dela achava que era melhor assim…

Não há certo nem errado. O que há são simplesmente formas diferentes de sentir, pensar e agir.

Uma vez li uma história sobre um homem que estava a colocar flores no túmulo do seu parente, quando de repente repara no chinês que colocava um prato de arroz na lápide ao lado.

- Desculpe, mas o senhor acha mesmo que o seu defunto virá comer o arroz?

- Sim, normalmente à mesma hora em que o seu vem cheirar as flores.

Esta história faz-me recordar algo parecido que se passou comigo, quando estava com uns amigos a contar como tinha sido a minha viagem à Índia. A certa altura falava-lhes dos rituais fúnebres que acontecem em Varanasi, onde eles queimam os corpos em grandes fogueiras.  

- Ai, que horror! Que barbaridade! – exclamou a mulher de um amigo meu.

- E enterrar os corpos debaixo da terra até eles serem totalmente comidos, também não é? – perguntei eu.

Tudo depende da perspetiva com que se veem as coisas. Bem como daquilo que cada cultura ou religião nos leva a pensar.

“O essencial é invisível aos olhos”

Não tenho nada contra os nossos rituais fúnebres. Nada mesmo. Cada um sente a dor como quer. A forma como cada um se despede dos seus entes queridos é consigo.

Se a minha tia se sente melhor dando beijos e abraços ao seu falecido pai que se encontra no caixão, então tudo bem.

Mas se eu prefiro ficar sozinha na varanda a falar com o meu avô – enquanto me cai uma espécie de pólen em cima vindo não sei de onde e que eu escolho tomar como alguma espécie de sinal – tudo bem também.

O que interessa mesmo é o sentimento. E esse ninguém consegue vê-lo, mesmo que se apareça em todos os funerais da família e amigos.

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